MARINA DA GLÓRIA NO IAB: PALMAS PARA A PLATEIA

‘Em qualquer situação é obrigação da prefeitura,
na qualidade de Poder Concedente, exigir
 que o gestor da Marina da Glória
 cuide das instalações corretamente’.

Parque do Flamengo – delimitação da área tombada
Imagem: página IPHAN

Na reunião promovida pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo – CAU e pelo Instituto de Arquitetos do Brasil – IAB, realizada ontem na sede deste, houve unanimidade entre os que se pronunciaram pelo menos em um aspecto. NINGUÉMfoi a favor do projeto de ocupação da Marina da Glória/Parque do Flamengo com um empreendimento comercial. NINGUÉM.


Se algum defensor da proposta esteve presente, silenciou, ao contrário do que aconteceu na Câmara de Vereadores no último dia 02 quando, salvo exceções, houve elogios exacerbados à proposta, bem como defesa do projeto, do empreendedor e da empresa, em meio a omissões, argumentos fracos e improcedentes, e até sapatos sujos, como foi explicado em CRÔNICA DE UMA AUDIÊNCIA PÚBLICA ANUNCIADA: O “ROAD-SHOW”DA REX-MARINA.


Estávamos na Casa do Arquiteto.


A apresentação foi feita pelo autor do projeto, o bem conceituado arquiteto Índio da Costa. Elegante, sereno e seguro, discorreu sobre implantação no terreno, integração, ‘mimetização’ e respeito ao parque, arquitetura, paisagismo, uso dos espaços, e também sobre aspectos sabidamente questionáveis: as consultas ao IPHAN, as medidas do edifício, a apregoada e duvidosa disponibilidade de espaços para o público que teria livre acesso à Marina, e o programa arquitetônico – Centro de Convenções e shopping (ou conjunto de lojas, como prefere).


Achamos estranho que durante o processo de reconhecimento das muitas qualidades da área e das suas imediações tenha sido ‘identificado’ o Hotel Glória. Acreditamos que a situação foi inversa: a partir do Glória ou mesmo simultaneamente à compra deste, o terreno da Marina estava previamente identificado pela empresa como de interesse à construção. A não ser que o ramo imobiliário do grupo navegasse por outros mares, quisesse apenas cuidar da marina pública… Improvável, mas, tanto faz…



Indicação sobre imagem Google Maps



O projeto em si foi elogiado por sua beleza plástica, qualidade que tem servido para desviar o olhar do cerne do assunto, isto é, a proibição de construir um complexo comercial de qualquer porte no parque público non-aedificandi, proposta que nada mais é do que integrar empreendimento comercial triangular que uniria as construções ao Hotel Glória e ao futuro Hotel Parque do Flamengo na Avenida Rui Barbosa, o edifício pertencente a clube endividado e posteriormente cedido… ao mesmo grupo empresarial. Curiosamente, a transformação de uso do prédio da Rui Barbosa foi possível graças à mudança na lei urbanística feita em 2010 especificamente para tanto.



Das várias intervenções destacamos: o arquiteto e professor Luiz Felipe Machado, pesquisador e estudioso da arquitetura modernista, defendeu o projeto geral de Affonso Reidy e o desenho de Amaro Machado para a Marina; Alexandre Antunes, representante da Associação de Usuários da Marina da Glória, afirmou que o projeto não contempla a náutica; o arquiteto Pedro Lessa defendeu a área pública, questionou o papel das instituições e entende que o IAB deveria posicionar-se perante o prefeito e opinar pela a manutenção do parque como tal; também demonstrou preocupação em relação à demolição dos prédios dos Batalhões da PM pelo governo estadual.




Estadão
Na fala e nas respostas cordatas da EBX-REX, direcionadas aos seus interesses, por óbvio destacamos inúmeros auto-elogios, a insistente menção ao IPHAN (Nacional – Brasília, DF) e aos esforços para atender ao solicitado pelo instituto – que deveria ser o guardião do parque, mas ora o despreza; as afirmações equivocadas de que o IPHAN determina o que pode ser feito na Marina, que o projeto atende a todas as leis (?); e a constante auto-promoção ao divulgar as virtudes da empresa e os inúmeros benefícios que o projeto trará – por exemplo, a despoluição da enseada com a doação de 5 milhões à CEDAE (?), a revitalização da vizinhança com a ligação ao bairro da Glória (?) e a recuperação do entorno do Outeiro da Glória (?).



As últimas afirmações, não pertinentes à Marina, beiram o ridículo, mas comprovam a hipótese do triângulo particular criado à custa daquele bem de uso comum. Melhorar a vizinhança da Igreja é melhorar a zona de influência do Hotel Glória, bom para a cidade, para o bairro, e… para o hotel, é claro!



apresentação da advogada e professora Sonia Rabello apontou aspectos graves que comprometem as pretensões de empresário e prefeitura. Informou que a empresa não é concessionária da área pública e, sim, detentora concessão de uso das instalações, o que não lhe dá o direito de construir; discorreu sobre aspectos de natureza jurídica, os objetivos e especificidades do tombamento, os antecedentes relativos à gestora EBTE que a REX sucedeu, as diferenças entre o projeto de Amaro Machado e a nova proposta; e mais: informou sobre ‘guerras de liminares’, a decisão de 2ª instância que confirmou ser a área non-aedificandi, e até o roubo do caminhão (!) que levava o processo judicial para Brasília, onde seria analisado o recurso à sentença que determinou a retirada dos toldos e o retorno às características originais da Marina.


Mencionou ainda que em 2006 o IAB emitiu parecer contrário sobre projeto semelhante.


Os esclarecimentos da jurista lançaram luz sobre o real significado da busca pela autorização do IPHAN que já dura 3 anos, alardeada como ato de respeito às normas embora nenhuma lei urbanística ampare o pretendido: embasar os argumentos da empresa no recurso à decisão judicial. Com o ‘de acordo’ do IPHAN ainda que este não tenha poderes para tanto, talvez o processo desaparecido ressurja das trevas.




Revista Piauí – Estadão

O “X” da questão está em querer usar a belíssima área pública para fins particulares e comerciais sob o falso argumento da revitalização. É O Elefante. O resto são Formigas, adereços.







A CEDAE deve fazer o que lhe cabe sem depender das “bondades” de quem deseja despoluir o local em interesse próprio. Não é necessário construir um Centro de Convenções no parque público para que ninguém estrague o sapato quando andar pela Marina.




“Prefeitura abraça T-REX”
Imagem: upnorthgeorgia.org

Em qualquer situação é obrigação da prefeitura, na qualidade de Poder Concedente, exigir que o gestor da Marina da Glória cuide das instalações corretamente, jamais abraçar a proposta.


NOTA: Perguntamos à mesa – então composta pelo representante da empresa e pelo autor do projeto de arquitetura – em que leis se basearam para elaborar proposta e projeto.


Não houve resposta.




TV BRASIL – NOTICIÁRIO 24/04/2013 – 21H



  1. Gostei muito de você ter ido à reunião, ter participado do debate com outros arquitetos e voltar a este blog para contar esta história. Apuração jornalística da melhor qualidade! Parabéns!

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