O editorial do O Globo e a Mais-Valia

É louvável o posicionamento do jornal O Globo em relação a mais uma edição da famigerada lei da “mais-valia” e de sua irmã mais nova, a “mais-valerá”. Infelizmente, o mesmo jornal defende outras barbaridades urbano-cariocas como construir na área pública chamada Jardim de Alah, silencia diante das leis tão ou mais perniciosas para a cidade como as que envolvem o Clube do Vasco e o Autódromo a ser construído em Guaratiba, bem como endeusa o futuro estádio do Flamengo que, entre outros questionamentos, decreta a morte do Maracanã.

Urbe CaRioca

Paes tem obrigação de vetar projeto que legaliza construções irregulares

Texto aprovado por vereadores anistia não só irregularidades do passado, mas também as futuras

O Globo – Link original

Prédios no Centro do Rio de Janeiro — Foto: Lucas Tavares / Agência O Globo

Vereadores do Rio prestaram um desserviço ao aprovar, na última quinta-feira, o Projeto de Lei Complementar (PLP) que permite legalizar não só obras em imóveis em desacordo com a legislação (por meio do pagamento de uma taxa conhecida como “mais valia”), mas até as que ainda serão feitas (mediante o pagamento de outra taxa, chamada “mais valerá”). O novo projeto ressuscita o conceito “pagou, liberou”.

Entre outros absurdos, o PLP autoriza proprietários de imóveis residenciais e comerciais em toda a cidade a licenciar empreendimentos com um andar além do permitido. O atropelo da lei pode ser ainda maior, uma vez que, nos bairros de Catete e Glória, na Zona Sul, prédios serão autorizados a receber acréscimos de mais de um pavimento, até alcançar a altura do maior edifício da quadra.

Na versão final, os vereadores estabeleceram que pedidos de licenciamento para irregularidades futuras poderão ser apresentados somente até 1º de dezembro (no texto original, o prazo era indeterminado). No caso das já existentes, proprietários terão até três anos para legalizar. O recuo não torna o projeto menos nefasto. Primeiro, porque abre brecha para que construtoras licenciem agora e construam depois. Segundo, porque essas anistias infelizmente se tornaram corriqueiras. Não aproveitou a atual? É só esperar a próxima.

Projeto semelhante foi aprovado no governo Marcelo Crivella, embora tenha sido considerado inconstitucional pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. Na gestão Eduardo Paes (PSD), uma lei parecida foi sancionada no ano passado, vigorando por cerca de dez meses.

Além de criar aberrações urbanísticas, o projeto é um contrassenso. Os vereadores acabaram de aprovar um novo Plano Diretor com diretrizes para balizar o crescimento da cidade pelos próximos dez anos. Meses depois, eles próprios o ignoram e criam novas normas. Se é para desrespeitar a legislação, por que criar regras urbanísticas?

Não se pode esquecer que a legislação urbana deve levar em conta fatores como densidade demográfica, fluxos de trânsito, impacto de vizinhança e interferência na paisagem. Não dá para desprezar tudo isso e autorizar, sem estudos técnicos robustos, que os prédios ganhem novos pavimentos só porque a Prefeitura quer aumentar a arrecadação em ano eleitoral.

O prefeito Eduardo Paes tem o dever de vetar esse projeto. Além dos muitos danos que ele pode trazer à qualidade de vida dos cariocas, é um incentivo à ilegalidade. Numa cidade em que o desrespeito a todo tipo de norma é um desafio histórico, a Prefeitura mostra ao cidadão que a irregularidade é perdoável — mas só para quem pode pagar. O município prevê arrecadar R$ 600 milhões com esse descalabro. Faltou estimar quanto será o prejuízo futuro para a cidade.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *