O parque não é mais aquele, de Roberto Anderson

Neste artigo, publicado originalmente no Diário do Rio, o arquiteto Roberto Anderson destaca que a Prefeitura do Rio abriu à população carioca o ainda inacabado Parque Oeste, em Inhoaíba, em plena campanha, “configurando uma burla da legislação eleitoral”, já que desde o dia 6 de julho são proibidas inaugurações por candidatos à reeleição.

“A jogada é que não foi bem uma inauguração, mas uma abertura (nada inocente) dos portões do parque ao público. Daqui a um tempo, se reeleito, o prefeito ainda poderá fazer a inauguração oficial”, afirma.

Urbe CaRioca

O parque não é mais aquele

Por Roberto Anderson – Diário do Rio

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Foto: Keller Fountain Park, em Portland

Duas semanas atrás, a Prefeitura do Rio abriu à população carioca o ainda inacabado Parque Oeste, em Inhoaíba. Isso se deu em plena campanha, configurando uma burla da legislação eleitoral, já que desde o dia 06 de julho são proibidas inaugurações por candidatos à reeleição. A jogada é que não foi bem uma inauguração, mas uma abertura (nada inocente) dos portões do parque ao público. Daqui a um tempo, se reeleito, o prefeito ainda poderá fazer a inauguração oficial.

Talvez a maior atração do parque seja a escada de águas, onde crianças e adultos se esbaldam, subindo e descendo enquanto a água corre continuamente. Há também esguichos vindos do chão, outra opção de quem deseja se refrescar no parque. Os arquitetos que vêm projetando os novos parques da Prefeitura, muito provavelmente, leram o paisagista americano Lawrence Halprin, que propõe parques assim, voltados para um lazer ativo. Com efeito, o Parque Oeste oferece ainda pistas de skate e byke cross. Espera-se que tenham lembrado de que Halprin propõe também espaços de calma, um balanceamento entre o Yin e o Yang.

O Parque de Madureira já conta com uma cascata para a criançada se banhar, assim como o Parque Suzana Naspolini. Este último ainda recebeu estruturas metálicas no mesmo formato daquelas chamadas de superárvores, existentes no Gardens by the Bay, em Cingapura. Lá, elas captam a água da chuva e servem de suporte à vegetação, como árvores verticais. As do Rio são menores que as suas congêneres e servem como peças de um espetáculo de luz noturno. Além disso, foram projetadas para também aspergir vapor d’água, que amenize a temperatura, a exemplo do que foi projetado nos calçadões de Bangu e de Campo Grande. Nos calçadões esses dispositivos já não funcionam.

Os novos parques cariocas parecem ser desprovidos de arborização intensa, talvez por suas mudas ainda serem jovens, ou por opção projetual mesmo. Definitivamente ficam para trás os parques voltados para o lazer contemplativo do século XIX, assim como os parques modernistas de Burle Marx e os parques de recuperação ecológica de Fernando Chacel, ambos do século XX. Os novos parques do Rio têm algo daqueles parques temáticos que a iniciativa privada oferecia, com entrada paga, como os parques de águas com piscinas e tobogãs. E são localizados em áreas com carência de lazer e áreas verdes, como as Zonas Norte e Oeste, o que é positivo.

Mas eles trazem um novo elemento, que é o alto custo de manutenção. As águas utilizadas precisam ser continuamente filtradas, as bombas que permitem seu circuito precisam ser mantidas, assim como as pistas para skate e bike-cross, as pequenas superárvores, os aspersores de água, as churrasqueiras… E os custos dessas manutenções não são pequenos.

A gestão, e o orçamento, do Parque de Madureira, o primeiro dessa série e, por muito tempo o único, ficou administrativamente alocada no gabinete do prefeito, algo atípico. Para o Parque de Madureira nunca faltaram recursos. Era a vitrine da outra gestão do prefeito. Não importava que a Fundação Parques e Jardins estivesse sucateada e com um orçamento apertado, que o Parque do Flamengo precisasse de restauração urgente, assim como o Campo de Santana e a Quinta da Boa Vista.

Nesses dois últimos as grutas construídas com estalactites e espaços para provocar curiosidade e fascinação estão há tempos interditadas por falta de manutenção. Os lagos artificiais do Campo de Santana sofrem com rachaduras no seu piso por onde a água se esvai. Um deles está permanentemente vazio há muitos anos. E as altas contas da Cedae, que mal cabem no orçamento desse parque, levam à pouca renovação das águas dos lagos. Na praça da avenida Princesa Isabel, em Copacabana, os repuxos de água vindos do piso, os primeiros a serem instalados na cidade, funcionaram por um par de anos e depois nunca mais.

Como se vê, parques têm custos e os novos parques da cidade têm custos muito acima da média dos parques que já existiam. A fórmula de só cuidar dos novos, os que dão dividendos políticos, é muito injusta. Não é correto pinçar alguns como vitrines e deixar os demais à míngua. Aparentemente, a proposta da atual administração municipal é a concessão dos parques à iniciativa privada. O Parque de Madureira, inclusive, já estava na lista do primeiro lote a ser oferecido em leilão.

A fórmula da concessão prevê o repasse de verbas municipais aos gestores e que esses possam auferir recursos com atividades lucrativas dentro dos parques. Mas com concessão ou não, as verbas públicas para a manutenção desses parques não podem sofrer descontinuidade, uma marca do nosso setor público. O próprio Parque de Madureira foi vítima de descaso na administração Crivella. Se no futuro a tradição de descontinuidade das políticas públicas se confirmar, as novas joias do sistema de parques da cidade correm o risco de sofrer do mesmo triste abandono dos nossos parques históricos. E o alto custo para sua manutenção poderá jogar mais água nesse moinho.

Comentários:

  1. Parabéns pelo artigo!
    Além da análise de planejamento e gestão de parques urbanos fica clara a ausência de lembrança , gestão e conservação das UC !
    Unidades de Conservação (da natureza e paisagem do Rio) !Visite e veja!

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