Artigo – CONTROLE URBANO DO DOMÍNIO PÚBLICO… CONTROLE PÚBLICO DO DOMÍNIO URBANO, de Eduardo Cotrim

Neste artigo o arquiteto Eduardo Cotrim analisa que os controles do uso do solo presentes nas leis urbanísticas são direcionados basicamente aos terrenos particulares, recorda avanços e retrocessos, e pondera que “o lado de fora dos lotes urbanos – ou seja, as áreas de domínio público (…) persiste desamparado de estudos perenes, formulações e diretrizes pelas municipalidades”.

Na acertada reflexão o autor nos lembra de que “Há que se criar meios permanentes de estudo e formulação conjunta para as mais evidentes lacunas urbanas externas aos lotes”.

Afinal, o território da cidade é um só.

Boa leitura.

URBE CARIOCA

CONTROLE URBANO DO DOMÍNIO PÚBLICO… CONTROLE PÚBLICO DO DOMÍNIO URBANO

Eduardo Cotrim

Um número de muitas centenas de cidades brasileiras, rumo à casa do milhar, conta com diretrizes legais para o controle diário das intervenções nos seus espaços edificantes e possui estruturas ou meios operacionais, ainda que mínimos, para aprovar projetos e fiscalizar edificações permanentemente. As dimensões e complexidade dessas estruturas públicas são sempre semelhantes às dimensões e complexidade das cidades.

Independente da maior ou menor capacidade que os órgãos de licenciamento e fiscalização dispõem para exercerem o controle das construções no território – ainda que nem todos os assuntos urbanos se resolvam por controles – há de certa forma, na esfera da aplicação das leis sobre o solo, uma institucionalidade já histórica, um pensamento aprofundado e recentemente consolidado pelo Estatuto da Cidade.

Observa-se que essa institucionalidade de controle da ocupação do solo, não tem impedido retrocessos urbanísticos como os conjuntões “pavilhonários” do programa Minha Casa Minha Vida e alguns malabarismos legais para benefício de poucos, como o Projeto de Estruturação Urbana, PEU das Vargens no Rio, que chega a permitir até 18 pavimentos em região da cidade ambientalmente sensível, que ainda guarda algum vestígio de campo. Provavelmente justificado pelo temor de que inimigos internos, ocupantes irregulares, cheguem antes dos dois ou três grandes especuladores locais.

Deve-se reconhecer que graças às mesmas institucionalidades públicas, discutem-se interesses sobre o solo privado em bases progressivas de equilíbrio. Se há lutas no espaço da legalidade urbana edilícia é porque aí não se encontram mais tantos ‘terrenos livres’ para surpresas e fatos consumados.
Pondera-se agora o lado de fora dos lotes urbanos – ou seja, as áreas de domínio público – que persiste desamparado de estudos perenes, formulações e diretrizes pelas municipalidades: os serviços públicos, os espaços comuns, para os quais não se conquistou ainda uma institucionalidade análoga às do controle do uso e ocupação do solo, em geral, de propriedade privada. Lá não se conquistaram ainda meios permanentes, institucionais, de ‘designo’, ainda com traços elementares – ‘designo’ como desenho resultante da escolha do melhor destino.

Sem dúvida, trabalha-se, encontram-se eficiências, mas quais destinos os melhores transportes devem atender, quais modalidades a serem priorizadas, quais as urgências de urbanização, onde escolas exemplares devem ser inauguradas, que praças devem ser implantadas, que corredores verdes, o que revitalizar numa cidade passo a passo?

Felizmente não se vive mais o ideal urbano moldado no início do século XX, do morar, circular e trabalhar anônimos ou na trama futurista de vias para lá e para cá, não importa para quem e como. Busca-se hoje a correspondência entre o conjunto de cidadãos reais de uma cidade real, com a eficiência de serviços e a qualidade dos espaços.
 
Não há mais a Cidade, há cidades. O Rio de Janeiro é uma delas.
 
Felizmente também, nos nossos dias, governantes e representantes do povo já não são mais obrigados a serem visionários, pelo contrário, valorizam-se os políticos que escutam. A passagem de uma geração de cidadãos por suas cidades, portanto, não deve ser delegada tão somente a uma sequência de vontades pessoais.  Há que se criar meios permanentes de estudo e formulação conjunta para as mais evidentes lacunas urbanas externas aos lotes. A democracia reside nas searas públicas.

É importante que certos domínios públicos essenciais sejam objeto de metas a serem alcançadas – de diretrizes objetivas de competência pública, a serem observadas pelos agentes urbanos e nossos mandatários.

05/04/2014

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