Copacabana mal-assombrada: O dia em que um fantasma quase derrubou um prédio na Av. Atlântica, de Maximiliano Zierer

Nota: A história é verídica somente quanto às construções e aos problemas causados pela demolição do casarão no edifício vizinho. 

Postado originalmente na página do Rio Antigo

Na madrugada do dia 17 de abril de 1970, ouviu-se um forte estalo no edifício Caramuru, situado na Av. Atlântica número 2388, próximo da esquina com a rua Figueiredo Magalhães. Uma coluna do edifício se rompeu na garagem, provocando um deslocamento do edifício em cinco centímetros da sua posição original. Outras colunas na garagem também estavam rachadas em sentido vertical, o que denotava estarem suportando um peso excessivo. Nos apartamentos do primeiro e segundo andar formaram-se pequenas fissuras nas paredes. O prédio tinha então apenas 26 anos de idade. Os moradores dos 24 apartamentos tiveram que evacuar imediatamente o prédio de 12 andares, devido ao risco de desabamento.

Após uma vistoria realizada pelas autoridades incompetentes (como de praxe), verificou-se que o sinistro foi provocado pelo fantasma do Dr. Assis Chateaubriand, que, inconformado com a recente demolição do casarão de sua propriedade, resolveu se vingar no edifício Caramuru, seu vizinho. Além da completa interdição do edifício Caramuru, foi necessária a paralisação das obras nas fundações do novo edifício Vila Normanda (o casarão do Chateaubriand tinha o nome de Vila Normanda).

Para resolver esta dramática situação, as autoridades incompetentes decidiram convocar o competente cabeleireiro de renome internacional Tutu la Minelli. Explico: o destemido Tutu não domina somente as técnicas de cortes, escovas, aplicação de cremes, químicas e tinturas. Nas suas horas ociosas, para ganhar uns trocados extras, Tutu realiza trabalhos de exorcismo de espíritos malignos e de almas penadas e depenadas que assombram os velhos casarões do Rio antigo. Tutu partiu então do seu salão Fleur de la Passion, localizado na rua Aires Saldanha, para expulsar o famigerado fantasma do Chateaubriand do terreno da Av. Atlântica.

Numa sexta-feira de lua cheia, armado apenas de sua expertise e de uma lagosta cozida – uma oferenda para apaziguar aquele encosto de fino gosto e trato – Tutu, com a sua argumentação racional (nosso herói é um grande racionalista) convenceu o fantasma do Chateaubriand a dar o fora dali e ir assombrar outra freguesia. Segundo o Tutu, não valia mais a pena habitar em uma Avenida Atlântica com um paredão de prédios colados uns aos outros e infernizada com o trânsito de uma avenida duplicada, onde até mesmo um fantasma não conseguiria mais viver em paz! (estávamos no meio da obra de duplicação e instalação do interceptor oceânico sob o canteiro central das pistas da Av. Atlântica).

Após a intervenção do impávido Tutu, porém, foi necessário o reforço estrutural nas colunas do edifício Caramuru, para afastar o risco de desabamento e permitir a volta dos moradores em segurança. Foi necessário encamisar 14 colunas (além daquela que estourou), ou seja, cada coluna foi cercada com novas vigas de aço e em seguida foi aplicada uma nova fôrma de concreto, duplicando a sua resistência. Deste modo, após mais de um mês (exatamente 35 dias), os moradores do Ed. Caramuru puderam finalmente retornar para os seus apartamentos, e entre mortos e feridos todos se salvaram.

Maximiliano Zieger

_______________________________________________

Foto da postagem original em preto e branco (casarão do Dr. Assis Chateaubriand, de nome Vila Normanda) de autor desconhecido, ano de 1958, pertencente ao Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro.
Texto, pesquisa e colorizações de Maximiliano Zierer.
Fontes: Jornal do Brasil, Correio da Manhã e livro Chatô: O rei do Brasil, de Fernando Morais.

Adendo (explicação para quem não acredita em fantasmas): O casarão do Chateaubriand tinha um muro lateral de concreto onde se encostava o edifício Caramuru. Quando o muro começou a ser demolido, notou-se a corrosão de algumas colunas laterais no edifício Caramuru. Segundo os engenheiros Wilbur Hockensmith (da firma Sisal, construtora do Ed. Vila Normanda) e José Conde (da empresa Estacas Franki, responsável pelas fundações do Ed. Vila Normanda) a construção do edifício Caramuru (1942-1944) não foi bem feita no que diz respeito às colunas laterais, que não receberam o revestimento de concreto necessário para evitar problemas futuros. Os pilares e as vigas foram construídos com defeito; a ferragem estava em muitos pontos corroída; a cobertura da ferragem, em geral, não era maior do que um centímetro. O muro de concreto existente na casa do Chateaubriand auxiliava as colunas laterais a se sustentarem. Quando o muro começou a ser demolido, uma coluna do Ed. Caramuru não suportou o peso e se rompeu.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *