DESCASO E DESRESPEITO PELA ARQUEOLOGIA URBANA, de Cláudio Prado de Mello

Na data de 24 de novembro, o jornalista Rafael Sento Sé divulgou uma noticia na Veja Rio informando sobre a descoberta de dois cofres na Rua General Glicerio, no local aonde existira uma fabrica importante no passado.

“Reparo da Cedae em Laranjeiras desenterra dois cofres fechados. Historiadores acreditam tratar-se de vestígio da Companhia de Fiações e Tecidos Aliança, que funcionava no local.

Um reparo corriqueiro da Cedae na pracinha no meio da Rua General Glicério desenterrou dois cofres antigos. Surpresos, moradores e comerciantes passaram a especular sobre o que haveria lá dentro, mas os artefatos permaneciam intocados até o fechamento desta edição, na terça (21). Historiadores acreditam tratar-se de vestígio da Companhia de Fiações e Tecidos Aliança, que funcionava no local e ditava o ritmo de vida do bairro no fim do século XIX e nas primeiras décadas do seguinte. A construção monumental em estilo inglês, que chegou a empregar 1 000 funcionários, foi demolida no fim dos anos 30 para dar lugar ao ajardinado trecho da via. Próximo dali, no início da Rua Cardoso Júnior, ainda está de pé parte da vila operária.” ( Cf: https://vejario.abril.com.br/…/reparo-da-cedae-em-laranjei…/ )

Essa noticia nos leva a uma reflexão muito seria que é o não cumprimento de um decreto municipal de Maio de 2003, da época de Cesar Maia, que digam o que quiserem, foi o ÚNICO PREFEITO que teve sensibilidade e deu atenção à Arqueologia, criando esse decreto e criando o DIA DO ARQUEÓLOGO a 26 de Julho, que depois veio a ser adotado a nível nacional. Pois bem !

Essa descoberta nos leva a mesma questão sempre ! O desprezo pelo ARQUEOLOGO que não chega a ser simplesmente chamado. Mas ele não e citado porque ele não é considerado e não e respeitado ! Mas ele não é respeitado porque ele nao é conhecido ou reconhecido … Tanto pela Sociedade como pelos Governos. Vejamos a questão da Regulamentaçao da Profissao de Arqueologo que entra ano e sai ano e continua tramitando na Camara, no Senado e ate hoje não teve um desfecho.

Isso nos leva a uma derradeira pergunta :

Porque ate hoje não se considerou a real necessidade de se ter nos quadros de funcionários de empresas que trabalham como o solo o emprego de Arqueólogos ? No Rio de janeiro, a LIGHT, a CEDAE e a CEG , mas tambem as empresas a serviço da NET, VIVO, CLARO e tantas outras de fibras óticas e cabos subterrâneos dia e noite abrem calcadas e asfaltos a fim de cuidar de seus interesses, mas ninguém esta atento ao patrimônio arqueológico que esta sendo destruído sem ser notado e peças relevantes para o conhecimento da Cidade do Rio de Janeiro tem sido dispersadas e descartadas de forma cruel e irresponsável.

Eu não posso me ater as inumeráveis vezes que recebi telefonemas, mensagens e emails da população informando que isso ou aquilo foi visto nessas escavações urbanas e que foram levados por alguém para ferro velho, descarte ou outro destino. Isso inclui canhoes de bronze achados no Engenho de Dentro, material relacionado à Escravidao em São Cristovao, material cerâmico na área do Sambódromo e tantas e tantos outros . naturalmente os orgaos de Patrimônio foram informados devidamente na época (!!!)

Entao, chegamos mais uma vez a uma noticia que revela que objetos de Arqueologia foram encontrados em escavaçoes da CEDAE , mas cadê a participaçao da Arqueologia ?

Vejamos o que diz o Decreto de 2003 …

DECRETO n.° 22.872, de 07 de maio de 2003.

Cria a Obrigatoriedade da Pesquisa Arqueológica nas Obras de Intervenção Urbana.
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas atribuições legais e,

CONSIDERANDO a importância do patrimônio arqueológico pré-histórico e histórico da
Cidade do Rio de Janeiro e a necessidade premente de incentivar ações voltadas para sua inserção
nas políticas públicas do Município;

CONSIDERANDO que a disciplina legal das atividades arqueológicas encontra-se definida
na Lei Federal 3.924, de 26 de julho de 1961, que dispõe sobre os sítios arqueológicos e pré-
históricos e na Portaria IPHAN n° 07, de 01 de dezembro de 1987, que regulamenta as pesquisas de
campo e escavações arqueológicas;

CONSIDERANDO o disposto na RESOLUÇÃO CONAMA n.° 01, de 23 de janeiro de 1986,
art. 6.°, inciso I, alínea C, que inclui os sítios arqueológicos no diagnóstico ambiental da área de
influência do projeto;

CONSIDERANDO o contido na Lei Orgânica do Município, de 1990, em seus arts. 342; 343,
inciso II, § 2.°; 350; 422, § 1.° e 429, inciso IX;

CONSIDERANDO as intervenções a serem implementadas pelo Projeto Rio Cidade e o
disposto no Processo n° 12/000.810/2003,

D E C R E T A :

Art. 1.° Todas as obras que envolvam intervenções urbanísticas e/ou topográficas realizadas
pelo Poder Público Municipal – direta ou indiretamente, em áreas que sugiram interesse histórico,
deverão prever estudos e acompanhamento com vistas a pesquisa arqueológica.

§ 1.° Os estudos definidos no “caput” indicarão a necessidade ou não de suplementação externa
por contratação de pesquisa profissional diretamente ou através de instituições universitárias.

§ 2.° Para efeito deste artigo, serão observados os seguintes procedimentos técnicos:
a) os impactos deverão ser identificados e mitigados através de pesquisas arqueológicas, que
constarão necessariamente de duas etapas:

1 – avaliação e diagnóstico;

2 – projeto de execução.

Art. 2.° Este Decreto entra em vigor na da de sua publicação.

Rio de Janeiro, 07 de maio de 2003 – 439.° de Fundação da Cidade

CESAR MAIA
D.O.RIO de 08.05.2003

Pois bem ! Nada mais a falar !
Tenhamos uma boa tarde !

* fotos dos cofres sao meramente ilustrativas

Andre Decout nos conta : “A fábrica de tecidos foi uma das maiores do Brasil à sua época, tendo contado com mais de mil funcionários, e foi fundada nos anos 80 do séc XIX, tendo sido fechada em 1937. Com o fechamento da fábrica o enorme terreno foi transformado num loteamento conhecido como Jardim Laranjeiras, o responsável por isso foi o último proprietário da manufatura, Severino Pereira da Silva, que certamente vislumbrando o alto valor fundiário das terras onde a fábrica se encontrava achou melhor negócio encerrar as atividades industriais e iniciar as imobiliárias.

O conjunto edificado mais marcante do novo loteamento é o conjunto de prédios ao longo da Rua General Glicério após a praça Jardim Laranjeiras, são edifícios altos afastados um dos outros, deslocados de junto da via pública por jardins e acessos para carros e já com forte flerte no modernismo, resultado do projeto de alinhamento do arquiteto Washington de Azevedo, as demais ruas foram loteadas com os lotes livres.

Curiosamente o Jardim Laranjeiras como um todo lembra muito o urbanismo de outra região da Zona Sul que era urbanizada mais ou menos ao mesmo tempo, que é o Bairro Peixoto em Copacabana, na tipologia dos prédios originais das ruas Estelita Lins, Prof Ortiz Monteiro e Belizário Távora, como na arborização original composta por sombreiros (mortos nos dois lugares por uma praga de pulgões ) e no mobiliário urbano original.

A lembrança deixada da enorme fábrica que existia no local é o conjunto edificado na Rua Cardoso Júnior, com casas que faziam parte da vila operária da Companhia Fiação e Tecidos Aliança, como aliás acontece em vários lugares da Zona Sul, onde as vilas operárias são as guardiãs de um pouco conhecido passado industrial de vários caros endereços.”

Claudio Prado de Mello, 02 de dezembro de 2017

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