Do asfalto ao trilho: o Rio e o custo da reinvenção sem planejamento

O Rio de Janeiro volta a discutir o futuro de sua mobilidade urbana. A Câmara Municipal aprovou, em primeira discussão, o projeto que prevê a transformação dos corredores do BRT em linhas de VLT — uma proposta que reacende velhos debates sobre custo, eficiência e coerência no planejamento da cidade. A ideia é substituir os articulados que circulam nos eixos Transcarioca e Transoeste por composições sobre trilhos, reaproveitando o traçado existente, mas exigindo nova infraestrutura. A promessa é de conforto, menor emissão de poluentes e integração visual com o centro remodelado, mas o desafio é gigantesco: reconfigurar um sistema bilionário, ainda em colapso operacional, sem repetir erros do passado.

Vale destacar que após terem feito uma obra dessa magnitude, quilômetro sobre quilômetro de BRT, compram ônibus caros, e agora simplesmente percebem que os mesmos não servem mais ? Causa perplexidade a quem vê no projeto mais uma guinada improvisada. O raciocínio é simples: a cidade já investiu pesadamente em um modelo de transporte que, embora problemático, poderia ser aprimorado. Descartá-lo integralmente para adotar o VLT implica não apenas novos gastos vultosos, mas o risco de transformar o território em um laboratório de tentativas e erros custeado por recursos públicos.

A crítica não é nova. O arquiteto e urbanista Roberto Segre já havia advertido, em 2016, que o VLT não é tecnicamente um transporte de massa, mas um modal complementar, com baixa capacidade e função essencialmente turística ou de conexão curta. Em corredores de alta demanda, como os do BRT, o VLT tende a ser subdimensionado — um luxo urbano travestido de modernidade. Diante disso, a transformação dos eixos expressos em trilhos parece menos uma política de mobilidade e mais uma estratégia simbólica: apagar a imagem desgastada de um sistema mal gerido, ainda que ao custo de repetir o mesmo erro — o de priorizar a estética e o marketing sobre o planejamento técnico e a racionalidade econômica.

Urbe CaRioca

Projeto que transforma corredores do BRT em VLT é aprovado em primeira discussão pela Câmara do Rio

Os alvos da proposta são os corredores Transcarioca e Transoeste, que somam mais de 80 estações

O Globo – Link original

Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

A Câmara Municipal do Rio aprovou, nesta quinta-feira (16), em primeira discussão, o Projeto de Lei Complementar nº 56/2025, encaminhado à Casa pelo Poder Executivo, que propõe a conversão das frotas de BRT dos corredores Transcarioca e Transoeste em Veículos Leves sobre Trilhos (VLT) ou tecnologia similar. Dos presentes, 37 vereadores votaram a favor e apenas três foram contrários. Agora, a proposta precisa ser aprovada em segunda discussão, antes de ir para sanção ou veto do prefeito Eduardo Paes.

— Aprovamos em primeira discussão a autorização. Agora a Câmara vai se aprofundar no projeto para avaliar melhorias. Uma das emendas em estudo prevê incluir também a Zona Sul nessa expansão do VLT — afirma o presidente da Câmara, Carlo Caiado (PSD).

A Transcarioca conta com os terminais Alvorada e Fundão, 45 estações e capacidade para transportar 16 mil passageiros por hora em cada sentido. A Transoeste, formada pelos terminais Santa Cruz, Mato Alto, Pingo d’Água, Curral Falso, Alvorada e Jardim Oceânico, possui 41 estações e a mesma capacidade estimada de transporte.

Um dos vereadores a votar sim à adaptação ao transporte sobre trilhos foi Paulo Messina (PL).

— Quando se tem um trajeto definido e fixo, o certo é optar pelo transporte sobre trilhos, que não é poluente, é mais rápido, de baixo custo e de manutenção mais fácil. Agora, com as pistas já prontas, é só adaptar para trilho. Vai ter um custo, mas, a longo prazo, vai ser bom para o passageiro, que terá um sistema de transporte mais eficiente — avaliou o parlamentar.

Audiência pública

Antes da votação, que ocorreu nesta tarde, em sessão extraordinária, houve uma audiência pública, realizada pela Comissão de Transportes da Câmara Municipal pela manhã, para discutir o tema. O encontro reuniu representantes da Secretaria Municipal de Transportes e da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, sob a condução do presidente do colegiado, vereador Marcelo Diniz (PSD). Também participaram os vereadores Flávio Pato (PSD) e Poubel (PL), vice-presidente e membro votante, respectivamente.

A secretária municipal de Transportes, Maína Celidonio, destacou os estudos desenvolvidos em parceria com o BNDES para avaliar as adaptações necessárias. Segundo ela, a conversão em VLT seria mais viável porque os corredores já possuem calhas e áreas desapropriadas, o que permite uma execução mais ágil.

— Os investimentos são mais altos, mas a qualidade é maior e perdura por mais tempo. A vida útil de um ônibus é menor que a de um trem — afirmou.

Sobre as escolhas pela Transcarioca e pela Transoeste, a secretária explicou que estes corredores já são consolidados, e que os gestores já conhecem as características e demandas das vias.

O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Osmar Carneiro, apresentou os impactos esperados com a implementação do projeto, que incluem benefícios urbanos e ambientais, como a redução de emissões de poluentes; sociais, com diminuição de acidentes de trânsito e geração de renda e empregos; e econômicos, por meio da redução dos custos operacionais.

— Teremos mais previsibilidade, controle e menos acidentes, já que vamos tirar mais carros das ruas — ressaltou.

O secretário também mencionou a possibilidade de adoção dos Veículos Leves sobre Pneus (VLPs):

— Visitamos as duas únicas fábricas do mundo com essa tecnologia, na China. Ela parece promissora em termos de custo-benefício, mas ainda precisamos compreender melhor seu funcionamento.

Durante a audiência, Carneiro também mencionou o projeto do VLT de São Cristóvão, com cinco paradas e 5,2 km de extensão em via dupla.

— Temos a vantagem de integrar o Pavilhão de São Cristóvão, a Quinta da Boa Vista e o Museu Nacional com a estação do VLT de São Cristóvão, o metrô, o trem e os ônibus — explicou. Em audiência anterior na Câmara, Maína Celidonio havia apontado o projeto de São Cristóvão como o de melhor custo-benefício.

Representando o Conselho da Cidade, Atílio Moraes fez críticas à proposta:

— Nos últimos anos, foram elaborados diversos projetos de mobilidade, especialmente para os Jogos Olímpicos, que não resolveram o problema. Estudos antigos apontavam esses corredores como linhas de metrô. Falta uma visão sistêmica sobre o que já foi analisado no passado.

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