Sem fios e sem calçadas

Uma triste CrôniCaRioca

Andréa Albuquerque G. Redondo, 20/09/2017

Hoje este site urbano-carioca trataria de fiação aérea e pavimentação de calçadas, assuntos que fazem parte da vida do morador da Cidade do Rio de Janeiro no seu dia-a-dia.

Impossível.

Tombos, estética e perigos causados pelo descaso com detalhes urbanos perdem a importância diante de mais uma onda de violência que cresce a cada minuto no nosso Rio que, dizem, é a Cidade Maravilhosa, ou, quem sabe, tenha sido.

Como falar sobre a horrível e embaralhada fiação aérea se ao olharmos para cima vemos primeiro balas – o projétil e não a guloseima – passando sobre nossas cabeças como cometas assassinos em busca do próximo alvo? Como falar sobre calçadas malconservadas, leito de buracos, depressões e ressaltos, quando nossas calçadas ficam manchadas de sangue todos os dias, o passeio é transformado em leito de morte de muitos inocentes, e de outros tantos menos ou nada inocentes?

Os mais velhos por certo se lembram de que havia jornais que “se espremer sai sangue”, como eram apelidados. Um ou outro caso escabroso, em geral crimes passionais ou terríveis acidentes, que alguns periódicos anunciavam na primeira página com manchetes chamativas e fotografias assustadoras – em preto branco, ainda bem – eram o motivo da piada de mau gosto. Leitores a caminho do trabalho, espantados, paravam em pé, ao lado das bancas, para conhecer as barbaridades da véspera.

Hoje, de todos os jornais de papel jorra sangue, a piada perdeu a razão de ser pela falta do inusitado.

Como falar sobre fios que levam energia se já falta energia para alimentar a esperança de que a vida do carioca melhore e possamos viver sem grades, sem celulares escondidos, sem precisar preparar a “carteira do ladrão”, sem jornalistas preparados para ir à guerra carioca – usando colete à prova de balas -, sem medo de andar pela rua, de ir ao mercado, à escola, ao comércio, passear a pé, de bicicleta ou de carro?

Apenas sem medo.

Como falar de calçadas, das pedras portuguesas que faltam, e dos buracos que causam tombos e feridas, quando falta segurança e sobram corpos tombados que não mais se levantarão? Quando sobram buracos feitos à bala e à faca levando vidas? Quando buracos indesejáveis nas calçadas tornam-se tão banais quanto aquele que ninguém deseja, o que causa a ferida, o que mata?

Hoje não é possível exaltar a cidade maravilhosa. É dia de mostrar a realidade tão diferente dos nossos cartões-postais, embora o sol continue a brilhar, e as ondas do mar continuem a bater, ambos indiferentes aos arrastões na areia e nas calçadas.

O Rio precisa mudar. O carioca está cansado de sentir medo. Porém, é evidente, que há os que querem manter o status quo, ou não estaríamos nessa situação há décadas, quadro que piora a cada dia, hora, minuto. Porque tamanha incompetência é incrível.

O site que adotou o pretensioso slogan de defender o Rio de Janeiro do ponto de vista urbanístico tem o dever de lembrar que a cidade precisa de socorro no fundamental quesito que é a segurança de seus cidadãos moradores e visitantes, ameaçados por muito mais do que fios desencapados e calçadas desniveladas. Qualquer outra reação será apenas coadjuvante.

 

Urbe CaRioca

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