SEMPRE O GABARITO – Banco Central, Gamboa, Zona Portuária

MOINHO FLUMINENSE, GAMBOA, ZONA PORTUÁRIA
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A Editoria de Opinião do Jornal O Globo de segunda-feira, 18/6/2012, trouxe ao debate o tema Flexibilização dos parâmetros de edificação na Zona Portuária com a publicação de dois artigos. Em NOSSA OPINIÃO foi publicado o texto Volta para o futuro, de autoria do importante veículo de comunicação. Em OUTRA OPINIÃO consta o texto Sempre o gabarito, de autoria da responsável pelo Blog Urbe CaRioca.

O objeto da discussão é o projeto de lei recentemente aprovado pela Câmara de Vereadores para aumentar, mais uma vez, o gabarito de altura do terreno do Banco Central, Bairro Gamboa, Zona Portuária do Rio de Janeiro, conforme noticiou o mesmo jornal em 31/5/2012.

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FOTO: DOMINGOS PEIXOTO (ARQUIVO)
Abaixo, os dois textos por extenso. Os links estão nos títulos respectivos.

TEMA EM DISCUSSÃO:
Flexibilização dos parâmetros de edificação na
 Zona Portuária
NOSSA OPINIÃO

Volta para o futuro

O Rio está diante de um daqueles momentos de transformação em que grandes e necessárias intervenções urbanísticas, algumas em curso, outras por serem iniciadas, moldarão o perfil da cidade para as próximas décadas. Num ritmo veloz, o município muda políticas de ocupação do solo, busca a modernização e procura resolver crônicas demandas que, a se perpetuarem, acabariam por inviabilizar à frente quaisquer esforços para legar à população melhorias da qualidade de vida. É um período de mudanças com o qual todos devem se comprometer — o poder público e a iniciativa privada como motores da metamorfose; a população, principal beneficiária, cobrando ações e com elas se solidarizando, mesmo que, a curto prazo, à custa de estorvos passageiros na paisagem urbana.

É momento, também, de a sociedade se desligar de preconceitos urbanísticos, deixando de lado anacrônicas ideias sobre uso e ocupação dos espaços da cidade. O Rio de hoje é tão bonito como aquele que, ao longo de décadas, encanta o mundo — mas é impossível fechar os olhos para a necessidade de o município se adequar aos novos tempos. É por este prisma que devem ser analisadas importantes iniciativas que têm por objetivo superar antigos contenciosos, e pôr a capital fluminense definitivamente no rumo de um futuro planejado.

Intervenções urbanísticas mexem com velhos vícios, cuja superação ainda encontra previsíveis resistências. Caso, por exemplo, da revitalização da Zona Portuária, de grande potencial econômico e residencial, mas uma das regiões mais degradadas da cidade. Não à toa, a área está incluída no pacote de instalações de apoio do projeto olímpico (ainda que a decisão só tenha sido tomada tardiamente, após um primeiro plano de ações que alijava o Porto dos benefícios decorrentes dos compromissos assumidos pelo Rio para promover os Jogos Olímpicos de 2016).

Décadas de uma política que juntou ações predatórias do poder público — por falta de planejamento ou por opções equivocadas de ocupação — e leniência das autoridades com as agressões (urbanísticas, ambientais e mesmo sociais) ali perpetradas transformaram a Zona Portuária numa terra de ninguém. Geograficamente colado à história do nascimento da cidade, o Porto ainda tem edificações que, mesmo sem preservação, compõem um importante e belo patrimônio imobiliário, ladeado por um pedaço da Baía de Guanabara que igualmente foi se moldando ao perfil de abandono de toda aquela região.

Recuperar essa área — como fizeram cidades como Barcelona (que, como o Rio, passou por um momento de grandes transformações impulsionadas pelas Olimpíadas), Nova York e Buenos Aires — implica ter coragem de enfrentar preconceitos, arrojo administrativo e compromisso com o futuro.

Neste particular, é positiva a iniciativa da prefeitura de rever gabaritos na área, ainda que pontualmente, mas como princípio para outras ações semelhantes. O primeiro passo é a mudança de parâmetro de edificação do prédio do Banco Central. Outros, se necessário, devem ser dados, como medidas imprescindíveis para o aproveitamento do potencial da região. A modernização da Zona Portuária é fundamental para reintegrá-la ao organismo urbano como opção (comercial, viária e residencial) à ocupação de áreas já saturadas.

Mas com o cuidado de não confundir o abandono de conceitos urbanísticos ultrapassados com licença para o caos, que já não deu certo em outras regiões da cidade. O planejamento é a chave para uma política acertada.

GAMBOA – GOOGLE MAPS
OUTRA OPINIÃO

Prosseguem as mudanças nas leis urbanísticas para modificar índices construtivos, uma constante desde 2009. A Câmara de Vereadores aprovou proposta do Executivo para aumentar o número de andares permitidos no terreno do Banco Central, Gamboa, Zona Portuária. É benesse urbanística institucional para atender à Casa da Moeda, e não simples especulação imobiliária — mas não cabe a benevolência. Em 2009 foram criados novos gabaritos de altura para a região. Na área que vai da Praça Mauá ao antigo Gasômetro e avança até a Avenida Presidente Vargas serão erguidos edifícios com até 150 metros de altura e 50 andares. Frente a esse gigantesco potencial construtivo é estranho que apenas há dois anos, neste governo, a autarquia federal não tenha sido contemplada conforme programa.

Houve razão: o terreno pertence à Área de Proteção Ambiental da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, a APA Sagas, iniciativa pioneira (1988) para a proteção do patrimônio cultural da cidade. A norma fixou altura máxima das construções em 11 metros, para garantir a harmonia com o casario preservado e salvaguardar a visibilidade dos morros.

A lei do Porto manteve o Sagas, exceção para o terreno do BC, cujo gabarito aumentou de 11 metros para 18 metros, contrariando a norma de proteção. Pelo visto, pouco: em 2011 o Poder Executivo enviou ao Legislativo o projeto de lei complementar que fará a Casa da Moeda crescer para 30 metros. Entre as justificativas está “contribuir para a valorização do patrimônio cultural tombado e preservado do entorno”. Um sofisma.

Mas, o texto é contraditório e inaplicável. Muda o gabarito “mantidas as demais condições de uso e ocupação do solo definidas na Lei (…) de 2009”. Isto é, a um só tempo obriga o respeito à área a construir e prevê seu aumento! Resta saber que magia criaria mais espaços conforme “solicitação do Banco Central do Brasil que objetiva (…) instalar em melhores condições a sede (…), ampliando, também, suas instalações”.

Diante da importância cultural do bairro cantado por Jobim e da impossibilidade teórica da lei, é oportuno buscar critérios que contribuam para um projeto de revitalização efetivo. Sugere-se: o veto ao PLC 47; a paralisação da construção iniciada; o embargo, caso a obra siga o gabarito novo, pois a lei, mesmo inaplicável, não está vigente; a escolha de terreno da União, no Porto, com gabaritos de 60 metros a 150 metros recém-concedidos; um acordo entre BC e União para permuta do terreno da Gamboa por aquele, pela importância do ato para a cidade do Rio.

Após, que a União ceda o terreno da Gamboa ao município. Que ali a prefeitura execute um belo projeto habitacional com respeito à altura original de 11 metros e aos bens culturais da vizinhança, com ruas e esquinas para caminhar e encontrar amigos, e com edifícios pequenos para famílias deslocadas em função das obras de revitalização, por exemplo. Futuros moradores certamente preferirão esse modelo habitacional ao conjunto de 40 andares e 1.330 unidades, à moda chinesa, que ficará bem perto.

Realizar o sugerido requer mais esforço do que assinar a lei, mas é tarefa menor diante das complexas trans-tudo ou de enterrar a Perimetral.

Não haverá prejuízo à revitalização, ao contrário. O Rio agradecerá.

ANDRÉA ALBUQUERQUE G. REDONDO é arquiteta.
China – Condomínio popular
www.artmasa.blogspot.com.br

Vila de Mídia e de Árbitros – projeto para a Zona Portuária




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