CrôniCaRioca
O olhar do cronista, traduzido em um passeio do Centro à Zona Sul, aponta várias entre as muitas belezas que a Cidade do Rio de Janeiro oferece em todas as regiões.
Urbe CaRioca
Caminhos
Mauro Bandeira de Mello *
Na volta do trabalho para casa, o aplicativo de trânsito, que supostamente indica a melhor rota, me manda virar à direita, mas sigo pela esquerda. Não importa! Vou pelo caminho mais bonito, pelo Aterro do Flamengo.
De cara, dou com o Pão de Açúcar. Que lindo! E nenhuma retenção no trânsito… Pois ele queria que eu fosse pela Praça da Cruz Vermelha. Cruzes! Já estaria engarrafado antes de chegar à Presidente Vargas.
Passo ao lado do Morro da Viúva, vejo a Enseada de Botafogo e o Corcovado. Que visão! “Em 800 metros, vire à direita.”, ordena o talzinho . Ora, pegar a Mena Barreto? Nem morto! Vou por Copacabana. Quero ver o mar, nem que haja retenções no tráfego.
Depois do Túnel Novo, a geringonça estúpida ataca novamente: “Em 200 metros vire à direita”. Só um robô sem um mínimo de inteligência artificial trocaria a Avenida Atlântica pela Barata Ribeiro! Não lhe dou ouvidos e tomo o caminho do mar.
Só paro no sinal da Siqueira Campos. O Copacabana Palace ficou para trás. Desagrada-me apenas a enorme faixa de areia que nos deixa longe da água. Ainda não é possível enxergar o “Golfo de Copacabana”. O sinal abre e o aplicativo continua quebrando a cara.
Tudo livre, a onda verde dos sinais flui rapidamente até a Bolívar. Lá adiante está o prédio daquilo que será um dia o Museu da Imagem e do Som. Gosto, não. Socorro! É muito feio! Ali, ficava a Boate Help. O mar ainda está longe… E, mesmo que não estivesse, a feira de artesanato no canteiro central da avenida impediria a visão.
Enfim, o Posto Seis. Na altura da Galeria Alasca, que virou igreja evangélica, já dá para ver o mar e os banhistas. O Posto Seis não sofreu com a ampliação da faixa de areia nos anos 1970. O hotel do novo Cassino Atlântico tem outro nome. Cassinos, mesmo, no Brasil, só os caça níqueis da internet.
Viro na Joaquim Nabuco. Já teria parado para tomar um chope. Mas como parar? Não há vagas. Cruzo a Avenida Copacabana na direção de Ipanema e me lembro do Caruso, o cinema das poltronas altas. Ficava ali pertinho. Mas nada de saudosismo!
Vieira Souto e rapidamente já estou na Garcia. Quanta intimidade para uma rua cujo luxo me repele… Atravesso o Jardim de Alah, que o prefeito deseja transformar num shopping (!!!), e não me lembro de jeito nenhum do nome do restaurante que havia perto da esquina, ao lado de um posto Esso. Serviam um filé com molho de estragão muito bom.
A Vieira muda de nome. A partir dali é Delfim. A vontade de tomar um chope aumenta. Lembro-me do Luna, do Bozó, Diagonal, Real Astoria, Pronto, Aloan, Le Coin… Bares que não existem mais. Daqueles que realmente só fechavam depois do último cliente. A sopa Albino Pinheiro podia ser servida no Luna às três da madrugada.
Entro na General Urquiza e logo estou no canal, no colégio André Maurois e na Marquês. Estou em casa. O chope e o bolinho de bacalhau não me escapam! O simpático restaurante da dona Celene me aguarda, o Bacalhau do Rei. Mas, droga, não encontro vaga!
O jeito vai ser esperar o futuro… Quando voltarei para casa voando, aterrissando onde a saudade me levar. Pela praia, óbvio! Quanto ao tal aplicativo de trânsito, é um fracasso retumbante. Mandaria Chapeuzinho Vermelho ir para a casa da vovó pela floresta…
*Mauro Bandeira de Mello é escritor, autor de dois livros e 300 crônicas, e advogado.
O restaurante chamava Alpino.