ANTIGO MUSEU DO ÍNDIO – 2: POR QUE DEMOLIR?

É sabido que o prefeito do Rio de Janeiro não acatou o parecer do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural e autorizou a demolição do prédio onde funcionou o antigo Museu do Índio.


 

O assunto tem sido debatido nas redes sociais.
Ao lado, o parecer do Conselho de Patrimônio Cultural.
A surpreendente defesa da demolição feita por ex-superintendente do IPHAN-RJ, reproduzida adiante, infelizmente, não nos surpreende.
Após o citado opinamento estão o comentário do Urbe CaRioca sobre o mesmo, outros que igualmente defendem a permanência da construção, matéria publicada no JB On Line, e decisão do Tribunal Regional Federal divulgada pelo OG On Line no dia 17.
 
Por óbvio outras pessoas também se manifestaram a favor da demolição e da retirada dos índios – na nossa visão sem argumentos consistentes. Aqui não tratamos do segundo aspecto. Entendemos que se os índios devem ou não permanecer no local é questão paralela, deve ser resolvida no foro adequado. O prédio pode e deve ficar, e ser integrado ao projeto de reforma/mutilação do Maracanã, conforme opinião divulgada na web. Consideramos tão somente o viés da memória urbana – ainda viva – da cidade, sem nenhuma conotação político-partidária, ao contrário do que tem sido afirmado por alguns (que o expediente vem sendo usado pelos defensores do prédio), a nosso ver é apenas o caráter acusatório de quem deseja diminuir a importância do bem cultural que Prefeito e Governador pretendem demolir.

Não é o nosso caso.

Seguem os citados comentários de jornalistas, arquitetos, juristas, instituições, e algumas personalidades públicas.

No final do post consta o vídeo de projeto divulgado pela própria Prefeitura, que revela a anterior previsão de permanência do prédio.

Espera-se que o Executivo responda à pergunta que dá título a este post.

Imagem que circula na web mostra  o antigo museu
e o Parque Aquático Júlio Delamare mantidos.

Projeto: Burle Marx & Cia. Ltda.

 
 
COMENTÁRIOS SOBRE O PRÉDIO HISTÓRICO ONDE FUNCIONOU O ANTIGO MUSEU DO ÍNDIO, LINKS DIVERSOS, E VÍDEO DA PREFEITURA COM PROJETO PARA REURBANIZAÇAO DA ÁREA.
Carlos Fernando de Andrade – Blog Urbe CaRioca – Fernando Walcacer – Evelyn Lima – Luiz Eduardo Pinheiro – Roberto Anderson – Comitê Popular RIO Copa & Olimpíadas – Guina Ramos – Milton Nascimento – Conversas Cariocas – Sonia Rabello –  MEU RIO – Caetano Veloso – Chico Buarque – Vídeo Prefeitura.

Carlos Fernando de Andrade – na web em 16/01/2013

Em princípio não sou a favor da demolição de prédio algum, mas acho importante que se coloquem alguns pontos nesta discussão que, aqui no Rio, ficou partidarizada e beira a irracionalidade;
 1 – No prédio a que se refere, funcionou, realmente, o Museu do Índio que, há décadas, mudou-se para um palacete no bairro de Botafogo, na Zona Sul do Rio.
2 – Seu acervo está bem preservado e, portanto, a memória indígena também.
 3 – O prédio que se pretende demolir pertence a CONAB e, desde que o Museu saiu dali, jamais teve uso. Grande parte dele já desmoronou.
4 – Por razões que desconheço, indivíduos de diversas etnias indígenas, cujas aldeias não se encontram no Estado do Rio de Janeiro, ocupam algum tempo o prédio, mas principalmente o terreno, e criaram esta, digamos, marca: Aldeia Maracanã.
Não sei a razão que os leva a ficar no Rio e se afastarem de suas aldeias. Posso imaginar algumas: estudam aqui, tratam da saúde, ganham a vida…
Ou seja, ninguém ainda foi à FUNAI saber por que eles não têm abrigo adequado, para os casos acima sugeridos, ou porque não retornam a suas aldeias, que, insisto dizer, não são no Estado do Rio.
As únicas aldeias indígenas aqui no Estado são de migração recente, e, vindo de São Paulo, se estabeleceram nos Municípios de Angra dos Reis e Paraty. O IPHAN acompanha e apoia as tradições destas aldeias, que se incluem na grande nação Mbia Guarani, que se estende da Argentina até aqui.
O Inventário Mbya Guarani é um trabalho tocado por quatro ou cinco países sul-americanos. Se alguém se interessar, pode ter mais informações no Departamento do Patrimônio Imaterial do IPHAN.
Quanto ao prédio, em si, nestes anos todos em que ele foi ruindo, ninguém entrou com um processo de tombamento, que é o instrumento legal para a manutenção de prédios que por alguma característica são extraordinários.
Tem sido uma prática comum, ao menos aqui no Rio, que quando se anunciam ações governamentais, pessoas ou entidades façam um escarcéu pela manutenção de algo que sempre esteve ali, mas ninguém nunca deu muita bola para ele.
 Foi assim com as cocheiras da quinta, o quartel da PM no centro do Rio, agora o prédio da CONAB.
Ou seja, infelizmente, vejo o patrimônio se tornar uma arma de ação político partidária, enquanto o patrimônio realmente tombado não merece a mesma atenção. Nem destes indivíduos nem da imprensa.
Eu disse claramente e repito que já temos inúmeros exemplares tombados e que não merecem o mesmo cuidado que o reerguimento deste prédio exigiria, já que, suponho, se alguém está querendo impedir a demolição é porque imagina que ele possa ser recuperado, tornar-se útil, etc. Ou o problema é que não gostam da Copa?
Blog Urbe CaRioca (comentário sobre o texto acima)
Torre na Lapa, Maracanã mutilado, Quartel da PM no Centro… O discurso veemente que defende a demolição do prédio onde funcionou o antigo Museu do índio, do Sr. Carlos Fernando de Andrade, ex-superintendente do IPHAN RJ, é totalmente equivocado. Mantém-se na esfera do viés político comum àqueles que ocupam cargos públicos transitórios, mas desejam tornar o passageiro, permanente.
Seus atos administrativos e discursos equivocados já colocaram o nome do importante órgão federal de patrimônio histórico – o IPHAN – em risco, por isso, falta-lhe credibilidade.
Muitos prédios históricos, tombados ou não, ficaram abandonados durante décadas e, um dia, por decisões políticas, oportunidades, interesse da iniciativa privada, entre outras possibilidades, vieram a ser recuperados. Este prédio pertence à União, que o deixou abandonado. Ideias de transferi-lo para a Prefeitura há alguns anos, infelizmente, não prosperaram. Mas, ainda haveria tempo, se houvesse um mínimo de sensibilidade e estudo, o que não parecem ser qualidades do nosso alcaide nem do governador.
Neste caso, o problema dos índios distrai a atenção do prédio em si. Se os índios devem ou não permanecer no local é questão paralela, deve ser resolvida no foro adequado. O prédio pode e deve ficar, e ser integrado ao projeto de reforma/mutilação do Maracanã. Vide o Centro de Convenções da Cidade Nova, intervenção urbana que contribuiu para a recuperação de um bem cultural igualmente abandonado, onde funcionou a antiga TV Rio, salvo engano.
O governo dá mau exemplo. Como exigir algo do particular proprietário de prédios históricos, quando despreza seu próprio patrimônio cultural e memória da cidade?
Fernando Walcacer
Que absurdo! O ex- superintendente do IPHAN no RJ, que ao que se saiba nunca tomou qualquer iniciativa para a sua preservação, argumenta com o abandono e o precário estado de conservação do prédio histórico do Museu do Índio para justificar a sua demolição. Diz isso com a tranqüilidade de quem sabe que jamais será responsabilizado por sua omissão, assim como não será responsabilizado o Estado que ele em certo período representou.
Justamente para evitar prejuízos ao bem comum, decorrentes da incompetência dos agentes públicos, a Constituição adotou um conceito abrangente de patrimônio cultural, cuja proteção, para tornar-se efetiva, independe do ato de tombamento (pode ser decretada, por exemplo, por decisão judicial, provocada por iniciativa de qualquer cidadão).
 
Evelyn Lima – Conselheira do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural
Nossa decisão tomou como base características do prédio e não se ele está ou não ocupado. Hoje ele ainda pode ser recuperado (sobre o parecer do Conselho que deliberou sobre a preservação do prédio).


Luiz Eduardo Pinheiro
“Eis a fragilidade do argumento de manter os índios na tal “Aldeia Maracanã”. Como os índios ocuparam o local recentemente, eis uma boa desculpa para a demolição: dar um local “melhorado” e pronto. O que está em jogo na verdade não é a tal aldeia e sim a História do local que é muito maior que essa meia dúzia de índios que ali se acomodam. A história indígena do local se faz por Rondon, por Darcy e pela permanência da denominação Museu do Índio no imaginário popular. Há outros fatos históricos ocorridos no prédio centenário. E há também o valor arquitetônico. Com o frágil argumento da manutenção dessa “aldeia” o prédio poderá ir abaixo!”.
 
Roberto Anderson
É uma decisão absurda. O prefeito nomeia os técnicos do Conselho, mas ignora a orientação do corpo técnico. Não há razão para demolir o prédio. Nos estudos que fiz, demonstrei que o prédio pode permanecer no local sem prejudicar o acesso dos torcedores ao Maracanã.
 
Comitê Popular RIO Copa & Olimpíadas
 
Guina Ramos
Esta seria a atitude decente de um governo supostamente democrático diante de um bem histórico, promover sua conservação e a valorização do seu valor cultural.
Por outro, a contingência da ocupação deste prédio, por parte de índios chegados ao Rio de Janeiro, está totalmente relacionada à precariedade da chamada “Casa do Índio”, na Ilha do Governador, como se pode ver neste e em vários outros blogs.

Milton Nascimento

Conversas Cariocas – Abaixo-assinado
Há semanas uma questão tem tomado à atenção de muitos cariocas e ativistas pelos direitos da causa indígena no Brasil. Supostamente, em função das obras de melhoramento do Maracanã e adjacências para a Copa de 2014, o governador Sérgio Cabral tem tentando demolir um prédio do século XIX onde hoje funciona o Museu do Índio, também conhecido como Aldeia Maracanã – a FIFA afirmou que não exigiu a demolição do local, contrariando a alegação de Cabral.
O projeto dos indígenas é a recuperação do prédio, que durante anos foi abandonado pelo governo estadual, para que abrigue um centro de cultura indígena e uma Universidade Indígena, como havia sido idealizado por Darcy Ribeiro e Marechal Rondon anos atrás.
Na história, o local já foi residência da família Real no período da Monarquia, em 1910 passou a abrigar o Serviço de Proteção ao Índio e de 1953 a 1978 o Museu do Índio – 1° Museu indígena da América do Sul, e tem cerca de 147 anos, o que não permite demolição do prédio segundo uma lei municipal. Na foto, como podemos observar, o prédio do Museu do Índio já estava no local antes mesmo do estádio Mário Filho, o Maracanã, ser construído. No período desta foto, podemos ver o antigo Derby Club.
Se isso não é motivo para o tombamento do local, ou pelo menos para impedir a demolição, eu não sei mais o que poderia ser considerado patrimônio histórico. Caso concordem com esta causa, um abaixo assinado está acontecendo, não demora mais de 2 min pessoal.
Sonia Rabello
Museu do Índio: desrespeito à memória
No dia em que o Governo da Cidade publica a sanção à lei de incentivo municipal aos produtores culturais, é também divulgado que o prefeito da Cidade, por uma penada de “duas linhas”, autoriza a demolição do prédio símbolo da cultura indígena na Cidade do Rio de Janeiro, desatendendo ao parecer do Conselho do Patrimônio Cultural da Cidade. Bravatas e contradições?
Este fato somente me mostra que os milhões a serem descontados dos impostos da Cidade para produção cultural de hoje poderá, em algumas décadas, ter o mesmo destino do prédio símbolo da cultura indígena – ou seja – chão, pó, ou lixo.
De que vale o dinheiro para produção cultural se não tivermos a garantia de que ela, depois de feita, será preservada para as futuras gerações? Será a criação de hoje um mero deleite dos produtores apenas do momento?
Se em 1865, o Duque de Saxe fez a doação do terreno (confira mais) e, depois, por ali passaram as atuações e o trabalho de centenas de brasileiros, dos incógnitos servidores públicos, aos famosos indigenistas, como Rondon e Darcy Ribeiro, e isso não tem valor cultural para Cidade, resta indagar: o que, então terá?
E aí, nem a memória do nosso futebol… em nome de que tudo mais estará sendo destruído, sobreviverá.
Rio, cidade sem memória, é cidade sem cultura: patrimônio da “des-humanidade”.

Caetano Veloso – LUTAS – OG 20/01/2013

… Enquanto escrevo (às pressas para não perder o voo para a Bahia), meus amigos do Rio estão guardando a Aldeia Maracanã, que recebeu, com a permissão finalmente dada por Eduardo Paes, o que parece ser um golpe fatal. Eu quase que ainda sou do tempo do Largo do Maracanã da valsa, anterior à construção do estádio Mário Filho (só o Nelson Rodrigues chamava o estádio pelo nome oficial).

Maracanã, esse nome indígena das aves verdes que soam como chocalhos espargidos no ar. Cuiubas, maitacas e maracanãs passavam pelo céu de Santo Amaro na minha meninice.

Será que a vulgaridade que ronda a atual administração estadual (sublinhada pela municipal) vai tomar conta do entorno do Maraca? Um prédio que foi o Museu do Índio, que tem a história ligada ao glorioso Marechal Rondon e que hoje se chama Aldeia Maracanã não pode ser posto abaixo. Ou será que já devo escrever “não poderia ter sido posto abaixo”? 
CHICO BUARQUE


A gente  deve lutar para que este espaço continue a ser um espaço público. O Maraca é nosso. O Maraca não está à venda (JB 27/11/2012)





VÍDEO



PROJETO APRESENTADO PELA PREFEITURA NO QUAL O PRÉDIO HISTÓRICO APARECE INTEGRADO À PROPOSTA DE REFORMA URBANA DO ENTORNO DO MARACANÃ, BEM COMO O PARQUE AQUÁTICO JULIO DELAMARE E O ESTÁDIO DE ATLETISMO CÉLIO DE BARROS.




AUTOR DO PROJETO: BURLE MARX & CIA. LTDA.
Divulgação: Prefeitura do Rio

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