Foto: Cláudia Girão |
Reproduzimos artigos do jornalista Elio Gaspari sobre o projeto para construção de Centro de Convenções e Shopping no terreno do Parque do Flamengo onde funciona a Marina da Glória: (1) A MARINAX DE EIKE BATISTA e (2) a carta fantástica do Governador Carlos Lacerda para o prefeito Eduardo Paes, De Lacerda.edu para EduardoPaes.gov.
Entre as justificativas para o pernicioso e ilegal projeto afirma-se que o Rio de Janeiro precisa de um Centro de Convenções médio. A capacidade do será erguido na área pública non-aedificandi é de 900 lugares.
Curiosamente, a imprensa divulgou que a empresa GJP Investimentos venceu a licitação da Infraero para implantação e exploração de um complexo que envolve a construção de um hotel e de um centro de negócios no aeroporto Santos Dumont: transformará o antigo prédio da Varig, ao lado do aeroporto – portanto, em frente à Marina, em hotel com 300 apartamentos e Centro de Convenções para 700 pessoas. Embora o local seja de interesse paisagístico, está fora dos limites do Parque do Flamengo. Na lista apresentada no post RIO DE JANEIRO – HOTÉIS EM REFORMA, EM CONSTRUÇÃO,EM PROJETO OU EM ESTUDOS certamente há empreendimentos hoteleiros que também oferecerão Centros de Convenções, uma boa pesquisa a ser feita pelo jornalismo investigativo.
Por outro lado, na entrevista concedida à Folha de São Paulo, o arquiteto francês Pascal Cribier mostrou-se preocupado com o projeto e afirmou que “o Brasil pode fazer papel de tolo perante o mundo“.
Sobre o Centro de Convenções disse:
“Paris é uma das principais cidades do mundo em realização de convenções e congressos. Estamos repensando a forma de fazer esses eventos, que têm ficado cada vez mais afastados do centro, para preservar a cidade. A ideia de ter um centro de convenções para 900 pessoas no Parque do Flamengo é uma catástrofe absoluta, em termos sociais e econômicos”.
Vale a pena ler os demais comentários do arquiteto.
Depois de conhecer o vídeo de apresentação do projeto, as afirmações do arquiteto autor do projeto, a defesa do empreendimento comercial feita pelo do Jornal O Globo – veemente e com argumentos errados e enganosos -, e constatar que o artigo LUGAR DE BARCO – contraponto àquela opinião -, fora retirado da página on line de acesso direto um dia após a publicação, é de concluir-se que o “road-show” da sedução que valoriza ‘as formigas’, esconde ‘o elefante’, e fomenta a vaidade, prossegue com vigor.
Blog Urbe CaRioca
O ELEFANTE E AS FORMIGAS
Fábula explicada em MARINA DA GLÓRIA: OS MISTÉRIOS NÃO INTERESSAM
Fábula explicada em MARINA DA GLÓRIA: OS MISTÉRIOS NÃO INTERESSAM
A MARINAX DE EIKE BATISTA
FOLHA DE SÃO PAULO, 20/01/2013
O doutor Eike Batista quer construir um centro de convenções na Marina da Glória, espetando um prédio com 15 metros de altura no aterro do Flamengo. Para ter uma ideia do que isso significa em termos de escala, o Museu de Arte Moderna, a mais alta e bela edificação do pedaço, tem 17 metros de altura e foi projetado por Afonso Reidy, um dos criadores do aterro. O doutor também quer criar um estacionamento privado para 750 carros.
A capacidade de persuasão de Eike Batista junto aos mandarins do Rio é infinita. Pede-se apenas que não deixe sua infantaria repetir que a cidade precisa de um centro de convenções naquele lugar.
Se o negócio é esse, por que não apresenta um projeto desse tipo ao prefeito Michael Bloomberg? Que tal colocá-lo no Central Park?
Em Nova York, quando se decidiu construir um centro de convenções, ele foi colocado numa área que precisava de revitalização. O Javits Center reergueu um pedaço do lado oeste da ilha. No projeto do Porto Olímpico do Rio, ao lado da estação da Leopoldina, numa área que precisa de revitalização, está reservado um terreno para um centro de convenções. Querem micá-lo?
O que o doutor quer fazer não é uma marina, mas um centro de atividade comercial, numa área tombada pelo Patrimônio Histórico. A tolerância das autoridades encarregadas de zelar pelo aterro permite que a concessão da Marina seja usada por mafuá de eventos onde outro dia desabou uma estrutura de metal, matando uma senhora.
Batista diz que gosta do Rio. Recomenda-se que peça ao cineasta Bruno Barreto uma cópia do filme que ele está fazendo sobre a vida da criadora do aterro, Lota Macedo Soares, e sua relação com a poeta americana Elizabeth Bishop. Vendo Lota e a expressão de seu amor à cidade medirá suas palavras e seus projetos.
De Lacerda.edu para EduardoPaes.gov
O GLOBO, 06/03/2013
O Eike Batista quer tirar proveito daquilo que a Lota previu: a ‘extrema leviandade dos poderes públicos’
ARTIGO – ELIO GASPARI – 6/03/13
Senhor prefeito do Rio de Janeiro,
Escrevo-lhe com autoridade: fui eu quem fiz o Aterro do Flamengo. Se não fosse a maluca da Lota Macedo Soares, miúdo vulcão de amor à cidade, aquilo seria um carrascal, parecido com as avenidas marginais dos rios de São Paulo. Foi ela quem concebeu a maravilha e eu quem pedi ao Instituto do Patrimônio Histórico, em 1964, que tombasse o parque. Tombado, não pode ter edificações adicionais que comprometam o seu espírito de área pública.
Aquela terra é do povo carioca. No governo do general Figueiredo, numa das tenebrosas transações da ditadura que ajudei a criar, ele transferiu a posse da área da Marina para a prefeitura do Rio e esta, concedeu-a a um grupo privado. Em bom português: surrupiaram um pedaço do parque. (De vez em quando vejo o Figueiredo por aqui. A Lota já tentou bater nele, mas o sujeito só conversa com cavalos.)
A “extrema leviandade” dos poderes públicos transformou a área da Marina num mafuá e agora o filho do Eliezer Batista, a respeito de quem nada digo, porque não se pode contar aí o que se ouve por cá, anuncia que pretende revitalizá-la.
Quer construir um shopping center (50 lojas), um estacionamento (600 vagas) e um centro de convenções com capacidade para 900 pessoas anexos ao Hotel Glória, que é dele. Sei da extensão dos poderes do moço e lastimo que o senhor esteja fora dessa discussão. (Sei também que circula com assessores que carregam numa sacola o projeto do doutor, defendendo-o.) O Iphan de Brasília teria dado um sinal verde preliminar ao projeto. A Lota, com sua fúria habitual, não entende como a presidente do Instituto, Jurema Machado, deixou a bola passar, pois numa reunião, há anos, lembrou que as obras, mesmo abaixo do nível do chão, poderiam impactar a intensidade do uso do parque. Há mais de vinte anos, conselheiros do Iphan usam a palavra “privatização” para condenar a velhacaria. Eu não gosto disso, porque tenho horror ao PT. O que não não devemos aceitar é que se tome ao povo um espaço que é dele, transformando-o num empreendimento comercial. O senhor sabe que o Rio precisa de centros de convenções. Sabe também que há um espaço reservado ao lado da estação da Leopoldina exatamente para isso. Sabe mais: que iniciativas desse tipo estimulam a revitalização de áreas degradadas, como fez Nova York com o Javits Center. O Aterro não está degradado, degradados estão os interesses que degradam-no.
O filho do Eliezer diz que fez um concurso internacional de arquitetura para escolher o projeto. O senhor acredita? Se o Iphan não defende o patrimônio da cidade, o senhor deve protegê-la. Basta zerar o velho cambalacho. Se o moço quer fazer uma marina, pode juntar-se à prefeitura. Esquece o centro de convenções, joga fora o estacionamento e põe as lojas no Hotel Glória. Peçamos a arquitetos de todo o mundo uma marina simples, pública.
Os mafuás erguidos no parque, e são muitos, nasceram do interesse predador de empresários amigos de presidentes, governadores e prefeitos. Eles são apenas espertos. Responsabilizá-los pela nossa leviandade é uma injustiça. Vá à luta. Defenda o parque que dei à cidade.
Saudações de um governante que amou o Rio, e é visto assim, mesmo por aqueles que o chamavam de Corvo.
Carlos Lacerda
Elio Gaspari é jornalista
Internet |