Um novo pacote de leis urbanísticas está a caminho. Segundo reportagem de Selma Schmidt ontem no jornal O Globo, de sete projetos de leis complementares, quatro serão enviados pelo Executivo à Câmara de Vereadores e três são de 2012 (Prefeitura lança medidas para incentivar projetos em áreas ociosas – Centro do Rio tem mais de 600 lojas fechadas).
É possível afirmar que as medidas, apresentadas como portadoras de melhorias gerais para a cidade e sua população, também levarão mais benesses para o mercado imobiliário: é o que se depreende do que o texto jornalístico apresenta, e que não surpreende, a considerar as propostas enviadas para os vereadores nos últimos anos – desde o Plano Diretor que deu origem à Lei Complementar nº 111/2011, a lei para Barra, Jacarepaguá, Recreio e região das Vargens, e para a Zona Portuária, até os pacotes “pra Olimpíada” e os vários PEUs.
Por isso tão importante quanto conhecer o texto é buscar as entrelinhas, onde moram as reais intenções do legislador: exemplos foram os casos do Campo de Golfe dito olímpico e do Parque Nelson Mandela, apresentados como redentores para o Rio, mas, nada além de grandes negócios imobiliários à custa de mudanças nas leis urbanísticas e ambientais vigentes. O mesmo pode ser dito sobre a lei das quitinetes para o Porto, disfarçadas de habitação popular.
Os PLCs devem ser estudados, debatidos e analisados em profundidade. Conforme temos reiterado quanto às propostas para o PEU da Ilha do Governador, a instituiçãodo ‘Direito de Superfície’ (negócios imobiliários/imbroglio jurídico), os gabaritos novos ao longo da Transcarioca, e outras, é fundamental (1) a participação de instituições afins, universidades e associações de moradores nos debates; (2) difundir as informações e conclusões; e (3) cuidar para que o novo pacote salvador não desvie o foco de outros assuntos importantes, também em tramitação na Câmara, que podem ser aprovados em breve.
Convidamos o leitor ao debate com algumas questões iniciais: (a) O que a Prefeitura entende por áreas ociosas? (b) ao ‘permitir’ apartamentos no andar térreo (o que não é proibido) este andar passará a contar no gabarito máximo, diminuindo-se o número total de pisos, e na área máxima de construção? (c) Por que o morador de prédio popular será submetido a subir 6 andares de escada? (d) Se o proprietário particular de imóveis sem uso ou abandonados sofrerá sanções, o que se pretende fazer em relação a próprios municipais, estaduais e federais que estejam na esma situação? (e) A contrapartida na forma de construir prédios populares poderá ser substituída por doação em espécie, conforme tem sido feito no caso de outras obrigações dos empreendedores desde o PEU Vargens? (f) Como se explica que imóveis abandonados/vazios possam ficar isentos de IPTU ou sofrer a aplicação do IPTU progressivo? (g) Devido à crise econômica que se abate sobre o país, que por certo influencia o aumento de imóveis vazios, é este o momento para as sanções? (h) As sanções serão aplicadas a unidades residenciais e comerciais vazias (apartamentos, casas, lojas e salas comerciais) isoladamente?
Abaixo, trecho da reportagem citada, itens que serão comentados preliminarmente nas próximas postagens.
Urbe CaRioca
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(O GLOBO, 23/08/2015) ALGUMAS PROPOSTAS
Estímulo à produção de moradia
Custo: Um projeto dispensa a construção de apartamento para zelador, alojamento e vestiários para funcionários e área de recreação (prédios com até cem apartamentos). Independentemente do número de unidades, edifícios de até seis andares não precisam ter elevador. Mesmo com estacionamento, o térreo poderá ter residências. Nos bairros atendidos por metrô, trens ou BRTs, basta uma vaga de garagem por apartamento. São obrigatórias a implantação de bicicletário para 20% das unidades, a arborização da calçada em frente ao prédio e a adoção de medidas para o uso racional da água.
Contrapartida: Outro projeto permite que a prefeitura determine que a contrapartida para licenciar a construção de imóveis residenciais, com mais de 500 unidades, e comerciais, com mais de dez mil metros quadrados, seja a doação de moradias populares no mesmo bairro do empreendimento. As residências podem ser em edificações novas ou reformadas.
Aproveitamento: Será pedida urgência na votação de um projeto que concede isenção de ITBI, de IPTU (por cinco anos) e de ISS (serviços de obras) para o aproveitamento de imóveis abandonados ou com intervenções paradas. O pedido de licenciamento da obra deve ser feito em até 24 meses após a sanção da lei.
Incentivos a negócios populares
Isenção: Para estimular a permanência do comércio tradicional, um projeto isenta de IPTU lojas de frente para a rua, que abriguem serviços e atividades como cinema, livraria, sapateiro e açougue. A medida não contempla estabelecimentos como shoppings, redes e franquias.
Transformação de uso
Preservação: Será pedida prioridade para a votação de um projeto que permite a transformação de uso de imóveis residenciais tombados e preservados. Eles passariam de unifamiliares para multifamiliares ou hospedagem turística. Esses imóveis poderiam ainda abrigar museus, bistrôs, livrarias, consultórios, ateliês, escritórios de arquitetura e design, entre outras atividades, desde que essa seja uma opção para a sua recuperação.
Combate a imóveis ociosos
IPTU Progressivo: Será pedida prioridade para a votação de um projeto que trata da cobrança de IPTU progressivo de imóveis vazios e subutilizados, inclusive os tombados e preservados. A proposta vale para o Centro e as zonas Norte e Sul. Uma emenda a ser apresentada estabelece regras. Os proprietários terão um ano após a notificação para utilizar o imóvel ou protocolar um pedido de licença para parcelamento do solo, construção, reforma ou restauração da edificação. Terão dois anos após a concessão da licença para iniciar as obras e cinco para concluí-las. O IPTU progressivo começa com 2,4% do valor venal (residências), 5,5% (comércio) e 6% (terrenos). Em 5 anos, chega a 15%.
Imobiliária Social Carioca
Aluguel subsidiado: Um projeto cria o Fundo Municipal de Locação de Interesse Social. O objetivo é aumentar a oferta de imóveis residenciais e comerciais (negócios populares e tradicionais) para aluguel subsidiado no Centro, Saúde, Gamboa, Santo Cristo, Lapa, São Cristóvão e Benfica. Os benefícios serão dados a famílias com renda de até R$ 5 mil, que trabalhem na região, e comerciantes e pequenos empresários com negócios na área.
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Caro Vinícius,
Obrigada pelo comentário esclarecedor e valioso para os debates. Será divulgado via rede Facebook, na Página Urbe CaRioca. Um abraço.
Essa proposta de IPTU Progressivo só poderá ser aplicada à Zona Norte, pois esbarra na norma do art. 71 do Plano Diretor Municipal do Rio de Janeiro, a saber:
"Do Parcelamento, Edificação ou Utilização Compulsórios
Art. 71. Lei específica de iniciativa do Poder Executivo poderá determinar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, fixando as condições e os prazos para implementação da referida obrigação, nos termos dos artigos 5º a 8º do Estatuto da Cidade.
§1º O disposto no caput se aplicará a imóveis localizados na Macrozona de Ocupação Incentivada conforme disposto nesta Lei Complementar. […]"
Pelo anexo II do PDM carioca, o Centro e a Zona Sul são macrozonas de ocupação controlada, e não incentivada (https://www.leismunicipais.com.br/RJ/RIO.DE.JANEIRO/IMAGENS/LC-111-2011.jpg).
Atenciosamente,
Vinícius Monte Custódio