NEM MAIS UMA TONINHA!*

Segunda Semana da Conferência Rio + 20

CrôniCaRioca

*O Blog Urbe CaRioca louva a iniciativa da campanha do Jornal O Globo – Mar sem Lixo, Mar com Toninha -, sobretudo pelo seu caráter educativo, o que, todavia, não invalida a ideia de uma CrôniCaRioca bem humorada cujo protagonista em crise de mal humor, reclama, mas colabora ao seu modo, e mostra que ainda há muito por fazer, em contraponto à atitude do amigo otimista e participativo, que nada questiona.

Ao amigo Nelson meu muito obrigada pelas ilustrações primorosas!

PAPO NO CALÇADÃO
Nelson Polzin, Junho 2012 
NEM MAIS UMA TONINHA!*               

Andréa Albuquerque G. Redondo
Foi na Praia de Copacabana, dia do Mutirão de Limpeza.
Lá estava eu tirando lixo da areia quando vi meu amigo caminhando pelo calçadão, esquisito, cara amarrada, passo apressado…
_ “Ô, Barbosa!”, disse. “Vem cá ajudar a catar lixo!”, e fui ao encontro dele. “Que cara é essa, Barbosa, nunca te vi assim, vem pro Mutirão!”.
_ “Não vou, tô revoltado!”.
www.ecoviagem.uol.com.br
_ “Mas, meu amigo, vamos salvar as toninhas!”.

_ “Ô, Almeida, vai me desculpar, mas eu salvo toninha desde que nasci”.

_ “Larga de mentira, Barbosa! Nunca teve mutirão prá salvar toninha, é a primeira vez!”.
www.skycrapercity.com

_ “Almeida, nunca joguei lixo na rua, muito menos na praia. Lá em casa era assim: lugar de lixo é na lixeira. Fiz igualzinho com meus filhos e eles, agora, ensinam aos meus netos. Não podiam jogar nada pela janela do carro. Nem papelzinho de bala, nem cuspir chiclete. Tinham que segurar o papel na mão até a casa. Quem mandou pedir chiclete, ficar igual a um ruminante? Ou continuava mastigando ou deixava grudado no dedo até encontrar uma lixeira. Pode perguntar a eles!

Agora fica esse povo catando porcaria dos outros. Garanto que só tem gente boa, consciente… feito você e eu. Os porcalhões estão em casa, rindo. Sujam tudo e deixam para os bobos limparem”.
www.flickr.com

_ “Mas, Barbosa…”

_ “Não tem mas, mas… Nessa cidade parece que está tudo pelo avesso! Esses que quebram os óculos do poeta devem rir igualzinho. Burrice! É o dinheiro dos impostos – nossos e deles – que paga tanto conserto. Vai ver se ensinassem poesia no colégio, explicassem quem foi Drummond…

Olha o caso do Metrô.
Vagão das Mulheres
www.blogdoodi.com.br
Não bastando ficar o povo todo espremido e mal atendido, tinham uns caras sem-vergonha se encostando nas mulheres. Em vez de pegar os caras, levar para a delegacia, anotar a ficha dos sujeitos, multar, fazer uma advertência… Qualquer coisa para educar, ensinar um pouco de civilidade… O que fizeram?

Um vagão feminino!!!Cor-de-rosa! Onde já se viu? Ficam as coitadas disputando um lugar apertado no vagão de mulheres e os malandros numa boa, atrás de outras vítimas, fora do trem do Metrô. Em seis vagões, só um para mulheres, e com horário certo: de manhã e à tardinha. Será que mulher não pega Metrô  ao meio-dia? No Rio de Janeiro tem muito mais mulher do que homem, né? Devia ter mais vagão para elas, então, e menos para os marmanjos!

  
Parada vagão das mulheres e horário
www.arealidadeelouca.wordpress.com
Tem mais: Em vez de terminar a Linha 2 atéa Carioca construir a Linha 4 Verdadeira, esticam a Linha 1 dando a volta ao mundo para chegar na Gávea e Barra, sem fazer a tal da rede como em todas as outras cidades! Isso não é Transporte de Massa, Almeida, é Transporte de Amassa”!

 _ “Ô coroa ranzinza, como reclama”!

Quartel da PM – OG 22/5/2012
_ “É sério, Almeida, tudo ao contrário.
Querem tirar os postos da orla porque as áreas ocupadas de Copacabana são de interesse público. Foi o governo que disse, está lá no jornal, é só conferir. Não entendo. Os postos estão lá quietinhos, não atrapalham nada e são úteis. E o Quartel da Rua Evaristo da Veiga, não é de interesse público? Importante para a Cidade? Claro que sim! Tem História! E o mesmo governo quer pôr abaixo prá vender”.
_ “Grande Barbosa, deixa de conversa e vem ajudar! Olha quanta criança participando, uma beleza de campanha, estamos ensinando e educando do mesmo jeito que você ensinou aos seus filhos”.

Cartaz de Alexandre Esteves – vencedor do
concurso do Globo, Quero Ver Toninha
Divulgação Globo On Line

_ “Não insiste, Almeida, já disse que não vou. Foi uma vida inteira salvando milhares delas! Chega! Nem mais uma toninha! Aliás, prá mim é golfinho mesmo.

Está tudo ao contrário. Quem não suja vem limpar. Deviam chamar quem sujou, ora pipocas! Escuta essa:
Semana passada, tava pegando sol na areia, quis beber água de coco. Pedi um coco ao barraqueiro. Na hora de ir embora chamei o rapaz, paguei, e pedi para ele levar o coco, já devidamente vazio, para aquela lixeira grandona, cor-de-abóbora, aquela que o Paulo** inventou junto com as pequenininhas que ficam nos postes, que ideia boa! O rapaz disse assim mesmo: Não vou levar não, fica aí, depois o gari*** pega.

BARBOSA E O COCO, CUIDADO COM O MEIO AMBIENTE.
Nelson Polzin, Junho 2012

Fiquei uma fera! O cara vive disso, trabalha usando a área pública que é a praia, não paga luz, água, aluguel, não dá nota fiscal, e tenho que ouvir: o gari pega! Que cara de pau, nem ao menos por respeito aos meus cabelos brancos… E lá fui eu, velho, dor nas juntas, dor em tudo, carregando cadeira, chinelo, barraca, sacola, saquinho de lixo COM O MEU LIXO… e O COCO, equilibrando tudo até à lixeira!”.

_ “Prá que cadeira, meu amigo, tem para alugar…”.

_ “Cadeira de aluguel dá micose! Meu dermatologista adora, fica assim de cliente. Melhor levar a minha cadeira para a praia”.
_ “Tá bem, Barbosa, leva tua cadeira, mas temos que participar, ajudar à campanha, é legal, tem as toninhas, e além do mais…”
Wikipedia

_ “Nem por um decreto! Vou continuar a minha caminhada antes que destombem o calçadão e a areia, como querem fazer com a Praça Nossa Senhora da Paz, e ponham tudo à venda para construir edifício. Já estou até vendo o anúncio – A nova Princesinha do Mar! Vista livre para as Cagarras!

Tchau, amigo Almeida, e obrigada pelo convite! Melhor voltar para sua tarefa. Eu preciso me exercitar para ganhar músculos e conseguir levar meus cocos até a lixeira no calçadão”.

NOTAS:

**Paulo Carvalho, ex-presidente da Comlurb que teve a boa ideia de instituir as lixeirinhas cor-de-laranja presas nos postes da cidade, no âmbito de amplo projeto educativo.
***GARI – Pedro Aleixo Gary. Durante o Império, assinou o primeiro contrato de limpeza urbana no Brasil. Costumava reunir, no Rio de Janeiro, funcionários para limpar as ruas após a passagem de cavalos. Os cariocas, que se acostumaram com esse trabalho, sempre mandavam chamar a “turma do gari”. Aos poucos e de tanto repetir, a população associou o sobrenome de Aleixo Gary aos funcionários que cuidam da limpeza das ruas (Fonte: Wikipedia).

Comentários:

  1. Gostei muito. Parabéns! Cada dia mais aprecio atitudes como as do Seu Barbosa. Direitos e deveres, isto é de todos, e para todos. Costumo usar uma frase: atrás de um stressado existe sempre um folgado! E além de folgado, acrescento o "mal educado.

  2. Toninha também é cultura… se assim não fosse, muita gente boa, jamais sabeia a orígem da palavra gari. E o Gari sambista, um dia, poderia levar a fama.
    E vamos salvar as Toninhas pq eu quero continuar vendo os golfinhos…

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