Audiências Públicas no Rio e alhures: espetáculos ilusórios, de Sonia Rabello

Neste artigo da professora e advogada Sonia Rabello, publicado originalmente no site “A Sociedade em Busca do seu Direito”, uma análise sobre as audiências públicas convocadas pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro e os seus questionáveis objetivos.

“A Prefeitura do Rio e a Câmara Municipal agendam audiências públicas `performáticas´ para justificar decisões já tomadas. Um exemplo é a convocação para esta terça-feira de uma audiência pública para `discutir a implantação do novo autódromo´. Com quem? Qual o projeto? Onde estão as informações financeiras? Onde está a lei que aprova a cessão privada ? “, destaca.

Urbe CaRioca

Audiências Públicas no Rio e alhures: espetáculos ilusórios

Sonia Rabello

A Prefeitura do Rio e a Câmara Municipal agendam audiências públicas “performáticas” para justificar decisões já tomadas. Assim foi na audiência pública sobre o construção de edificação no Mirante do Pasmado, área de uso comum do povo e de interesse ambiental, bem como na convocação para uma audiência pública para “discutir a Implantação do autódromo” na área de Floresta de Camboatá.

Também, nos Conselhos, as discussões têm sido meramente para cumprir formalidades, já que:

1. Não há difusão prévia das informações a serem debatidas;

2. Não há tempo para debates;

3. Não há previsão de contraditório de debatedores com opiniões divergentes;

4. Não há qualquer previsão de se levar em consideração as opiniões divergentes daquela tida como o desejo oficial.

Um exemplo típico é a convocação para esta terça-feira, dia 18 de junho, de uma audiência pública, na Câmara Municipal do Rio, para “discutir a implantação do novo autódromo do Rio de Janeiro”.

Discutir com quem? Qual o projeto? Onde ele está? Onde estão as informações financeiras? Onde está a lei que aprova a cessão privada, como exigência do Tribunal de Contas do Município ?  A convocação dos convidados a participar é ridícula; desde o presidente da República, governador, prefeito, secretários, licitante não contratado, e por aí vai.

O que a Argentina pode nos ensinar a respeito?

Em 2016 publicamos um blog sobre uma importante decisão da Suprema Corte da Argentina na qual assentou-se “condições” de legitimidade, e portanto de validade para o que se poderia chamar de audiências públicas.

Recordando as “condições” resumimos:

“Ressalte-se que para este direito não ser ilusório , devem ser cumpridas as seguintes condições .

1 . Em primeiro lugar, todos os utilizadores têm direito a receber a partir da informação adequada, veraz e imparcial estatais de forma prévia, ou seja, antes da realização das audiências .

2. A segunda condição é dado pela celebração deste espaço de discussão entre todos os interessados ​​, com um sistema adequado que permita a troca de ideias responsáveis ​​em termos iguais.

3.  Finalmente, este direito deve ser valorizado no momento em que o executivo toma a decisão . Caso contrário, todos os passos acima constituem ritualismo puro, se a autoridade não considerou a razoabilidade, na oportunidade de tomar resoluções sobre o caso, das situações e dos argumentos que foram apresentados na audiência.”

Já que aqui continuamos fazendo audiências públicas fakes, aproveito para reproduzir, com maiores detalhes os fundamentos explicativos de cada um dos três itens acima:

1 . Informação substancial sobre o tema, prévia à decisão, adequada e verdadeira

“La participación de los usuarios con carácter previo a la determinación … constituye un factor de previsibilidad, integrativo del derecho constitucional a una información “adecuada y veraz” (artículo 42, Constitución Nacional) y un elemento de legitimidad para el poder administrador, responsable en el caso de garantizar el derecho a la información pública, estrechamente vinculado al sistema republicano de gobierno (artículo 10, Constitución Nacional) (fl. 12) … En este sentido, el debate público mejora la legitimidad de las decisiones al requerir criterios comprensivos de las distintas posiciones para arribar a un consenso entrecruzado, que si bien no conducirá a lo que cada uno desea individualmente permitirá en cambio lo que todos deseamos, es decir, vivir en una sociedad ordenada sobre la base de un criterio más realista de justicia. (Rawls, John, Justice as Fairness. A restatement, Harvard, Harvard University Press, 2001)  (…)

Desde una prelación temporal, en primer lugar se encuentra un derecho de contenido sustancial que es el derecho de todos los usuarios a recibir de parte del Estado información adecuada, veraz e imparcial. La capacidad de acceder a una información con estas características es un elemento fundamental de los derechos de los usuarios, pues ese conocimiento es un presupuesto insoslayable para poder expresarse fundadamente, oír a todos los sectores interesados, deliberar y formar opinión sobre la razonabilidad de las medidas que se adoptaren por parte de las autoridades públicas, intentando superar las asimetrías. (…).

2. O espaço da discussão deve ser igualitário e equitativo entre os prós e contra.  

“La segunda condición está dada por la celebración de este espacio de deliberación entre todos los sectores interesados, con un ordenamiento apropiado que permita el intercambio responsable de ideas en igualdad de condiciones y mantenga en todo momento el imprescindible respeto por el disenso, bajo el connatural presupuesto de que constituye un foro de discusión por un tiempo predeterminado en función de las circunstancias del caso y no de decisión, que se mantiene inalterada en manos de la autoridad pública.

3. A decisão, para não ser ilusória, deverá levar em consideração as ponderações havidas de todos os envolvidos.

y por último, este derecho compromete, precisamente, ese momento decisorio, pues todas las etapas anteriores constituirían puro ritualismo si la autoridad no considerara fundadamente en oportunidad de tomar las resoluciones del caso, las situaciones y argumentaciones que se expusieron en la audiencia y el modo en que ellas inciden en las medidas que se adoptan.

 

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