APAC é a sigla para Área de Proteção do Ambiente Cultural.
As APACs existem em terras cariocas desde a década de 1980, quando foram editadas as leis que aprovaram o Projeto Corredor Cultural, para parte do Centro do Rio de Janeiro, e o Projeto SAGAS. O segundo foi assim chamado por ter preservado conjuntos de construções dos bairros da Saúde, Gamboa e Santo Cristo, vizinhos ao Centro da cidade e que abrangem a região portuária, a eles unida após a construção dos aterros que deram origem ao então novo porto do Rio de Janeiro, no início do século XX.
Antes mesmo desses dois exemplos, os sobrados da Rua da Carioca já haviam sido protegidos no final da década de 1970 (Decreto nº 1707/1978).
O movimento pela proteção da memória urbana através da manutenção de grupos de edificações por seu valor de conjunto vinha para complementar o instituto do Tombamento, regulamentado desde 1937 e voltado, em especial, para bens culturais com valor individual. Por outro lado, reproduziu conceitos adotados internacionalmente desde a edição da Carta de Atenas, em 1931.
Após o Corredor Cultural e o Projeto SAGAS o número de APACs cresceu significativamente. As diversas gestões municipais subsequentes promoveram a valorização do patrimônio cultural carioca edificado disseminando a proposta inicial por todo o município.
Na década de 1990 as APACs chegaram à Zona Sul, onde os bairros são objeto de renovação urbana constante e acentuada – substituição poderia ser a palavra mais adequada. Conjuntos de casas e pequenos prédios foram preservados nos bairros de Laranjeiras, Botafogo, Humaitá, Glória, Catete, Jardim Botânico, Ipanema e Leblon.
Junto com a iniciativa imediatamente começaram as pressões pelo seu cancelamento, pois, tratava-se da valorizadíssima Zona Sul, primeiro objeto de desejo do mercado imobiliário, mesmo com a crescente ocupação da região da Baixada de Jacarepaguá pelos investidores ligados à construção civil.
Neste ano de 2017 nada é diferente. Nota no Jornal Extra afirma que o prefeito pode “flexibilizar as APACs”. Tradução – Retirar a proteção que garante a volumetria e características externas de conjuntos protegidos. Leia-se: permitir a sua demolição e substituição.
A nota foi reproduzida no site da Associação dos Dirigentes do Mercado Imobiliário – ADEMI.
Crivella pode ‘flexibilizar’ as Apacs – Jornal Extra, Berenice Seara, 28/mai
A gestão de Marcelo Crivella (PRB) estuda uma forma de “flexibilizar” as Áreas de Proteção do Ambiente Cultural (Apacs), criadas em 1992 e implementadas pelo ex-prefeito Cesar Maia em vários bairros, especialmente na rica Zona Sul.
A ideia, que ainda está no estágio bem inicial, seria permitir que imóveis sejam construídos em desacordo com o conjunto urbano representativo dos bairros preservados (ou seja, deixar que predinhos velhos sejam demolidos, e edifícios “um pouco mais altos” sejam erguidos em seus lugares).
Claro, desde que a construtora compre Certificados do Potencial Adicional de Construção (Cepacs), que seriam emitidos especificamente para isso.
O objetivo é reforçar o tão combalido caixa do município.
Queridinhos
Os Cepacs, usados por Eduardo Paes (PMDB) para impulsionar a revitalização da Região Portuária do Rio, são os novos queridinhos da turma de Crivella.
Eles também seriam a forma de capitalizar a operação que Crivella deflagrou, na Rússia, para revitalizar o entorno da linha férrea da cidade.
É sempre assim. Muda o governo e recomeça a pressão pela extinção das APACs, só na Zona Sul, é claro. Não se menciona “flexibilizar” as leis para Gamboa, Marechal Hermes, Santa Teresa, Mangueira, Benfica, Santa Cruz, Paquetá…, ao menos por ora.
Vale recordar que o antecessor do atual prefeito é o responsável por um precedente perigosos, como foi alertado por este blog: no escurinho do cinema, ‘destombou’ o Cinema Leblon, para atender aos interesses do mercado imobiliário. Também houve a retirada de imóveis protegidos nos bairros do Catumbi e Campinho, porém, para permitir a construção de novas arquibancadas no Sambódromo e para a passagem do BRT, respectivamente. Nesses casos, em tese, o interesse público prevaleceu sobre o interesse particular, hipótese em que alterações pode ocorrer, à luz das leis vigentes, embora tenha havido a discordância de historiadores e preservacionistas. Ao contrário do que aconteceu com o prédio do Cinema Leblon, e da proposta que se avizinha, segundo a nota no jornal que abre este post.
Há que ter atenção. Os quatro anos da nova gestão mal começaram.
Urbe CaRioca