O artigo reproduzido a seguir, publicado na Revista Piauí no último dia 20/10, resume a situação do Rio de Janeiro nos dias atuais: entrelaça aspectos urbanísticos com a falta de segurança que cresce a cada dia em toda a cidade, e faz a antes alegre e acolhedora população, amedrontada, esconder-se mais ainda atrás de grades e câmeras de vigilância, e providenciar policiamento privado, o que, é evidente, não ocorre nas regiões dominadas pela bandidagem, onde os moradores são também reféns. Decisões equivocadas, prioridades questionáveis, abandono dos espaços públicos, e lugares onde falta a presença do Estado não são prerrogativas apenas da gestão em curso. Porém, tudo sobressai após a euforia trazida pelos grandes eventos – Copa do Mundo, Jornada Mundial da Juventude e Jogos Olímpicos, realizados a contento, cabe lembrar – quando, durante breve espaço de tempo, foi possível caminhar pelas ruas sem medo de assaltos e balas perdidas, a derrocada econômica apenas começara, e contendas estavam suspensas.
O Rio precisa mudar. Não será com novos aumentos de gabaritos na Região das Vargens – repetindo-se o polêmico modelo adotado na Zona Portuária, nem com “banho de loja” na Rocinha, muito menos com uma proposta irreal para a favela Rio das Pedras, que os graves problemas serão resolvidos. Permitimo-nos uma observação em relação ao que afirma o autor. Não se trata de falta de um masterplan. Temos um plano diretor, nada além de um conjunto de diretrizes elaborado com um único objetivo: aumentar o potencial construtivo em várias regiões em nome das Olimpíadas. Esse era o plano.
Urbe CaRioca
Francesco Perrota-Bosch
Na tarde de 22 de setembro, enquanto tanques de guerra subiam novamente a Rocinha e os tiroteios na favela eram transmitidos ao vivo pela televisão, percebeu-se uma ausência eloquente: cadê o prefeito? Quarenta e oito horas depois, Marcelo Crivella fez um pronunciamento no qual, mais do que tratar de segurança pública, revelou um pouco da sua ideia de cidade: “Agora que o Exército está na favela, é hora de subir o morro para fazer consertos, reparos, obras e trocar lâmpadas. Vou conversar com meu time para, a partir de amanhã receber líderes comunitários na prefeitura: é importante que a gente possa mobilizar o pessoal do setor de conservação para fazer aquela obra que estamos devendo para a Rocinha. É a hora de aproveitar esse momento para fazermos um banho de loja na Rocinha.”
De tempos em tempos, o Rio de Janeiro dá sinais de bipolaridade política – o que se reflete, também, nas noções urbanísticas de seus governantes. Após os anos de preparação para as Olimpíadas, quando era impossível não perceber e falar das transformações urbanas, passamos à era do “banho de loja”.
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