VENDO O RIO – DIREITO DE SUPERFÍCIE: COMENTÁRIOS INICIAIS



Trata-se de novas benesses e negócios urbanísticos à custa do solo, do subsolo, e do espaço aéreo urbano-cariocas, em alguns casos mediante pagamento à Prefeitura. Leia-se: construções permanentes sobre ruas, interferência na paisagem urbana, aumento da intensidade de uso e áreas construídas nos bairros.


Pode haver algo positivo. Em princípio, abrir vãos em empenas – mas, por que pagar à Prefeitura? – e permitir atividades junto às estações de trem para levar animação, parece interessante.Há que estudar cuidadosamente item a item e simular cada situação com imagens e cálculos de áreas, o único modo de vislumbrar o resultado de proposta tão intrincada.


Até aqui foram quatro postagens sobre o Projeto de Lei Complementar nº 96/2015 que “institui a aplicação do direito de superfície para fins urbanísticos no município do Rio de Janeiro”, proposta enviada pelo Poder Executivo à Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro que será objeto de Audiência Pública amanhã, terça-feira, dia 31/03, às 9.00h, em Plenário, reunião organizada pela Comissão de Assuntos Urbanos daquela Casa:

 

20/03/2015 – VENDO O RIO – REUNIÃO E DEBATE DIA 23/03/2015

23/03/2015 – VENDO O RIO – DIREITO DE SUPERFÍCIE: O PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR

24/03/2015 – Artigo de Sonia Rabello – DIREITO DE SUPERFÍCIE NO RIO: NOTA SOBRE UMA TENTATIVA DE IMBRÓGLIO JURÍDICO

27/03/2015 – DIREITO DE SUPERFÍCIE – AUDIÊNCIA PÚBLICA NA CÂMARA DIA 31/03/2015

 

A considerar os aspectos jurídicos apontados pela professora Sonia Rabello seria um projeto natimorto. Porém, diante de tantas leis urbanísticas questionáveis aprovadas nos últimos anos – PEU Vargens, Plano Diretor, Parque Olímpico, o Campo de Golfe de muitas faces, Parque Ecológico Marapendi, o Parque Nelson Mandela das benesses urbanísticas, entre muitas outras -, e o pedido de urgência* na votação, a pressa em liberá-lo não será surpresa.

No dia 27 lançamos a hipótese de que as novas condições para construir no Rio de Janeiro, a serem criadas por lei, são direcionadas a projetos existentes, provavelmente levados aos gestores públicos pelos respectivos interessados, seja do setor da construção civil, do mercado imobiliário, e concessionários de transportes. Nessa suposição vários artigos “desenhariam” situações específicas, talvez exclusivas ou mesmo individuais.



Barra da Tijuca – Construção sobre logradouro público.
Foto: Urbe CaRioca, 28/03/2015

Encontramos uma construção sobre espaço aéreo público – obra em andamento – n Barra da Tijuca, que comprova aquela teoria. Basta confrontar com o artigo 8º do PLC, o que também nos remete imediatamente às passarelas provisório-permanentes entre o Hotel Copacabana Palace e a Praia de Copacabana, ou as construções no Posto 6 que ligam o Hotel Sofitel ao Forte de Copacabana. Do outro lado da Avenida Borges de Medeiros, oposta ao terreno onde Prefeitura autorizará o ginásio/arena do Clube Flamengo existem dependências do Remo. Quem sabe, uma ligação semelhante está por vir?

 

Art. 8º A concessão do Direito de Superfície para a construção de edificações no espaço aéreo sobre logradouros públicos estará sujeita às seguintes condições:

I – análise e aprovação dos órgãos responsáveis pelo planejamento urbano,pelo licenciamento de edificações e pela tutela da paisagem da Cidade, quando for o caso;

II – estabelecimento de vão livre sobre o logradouro que respeite o gabarito rodoviário;

III – construção de no máximo um pavimento na área concedida, com altura máxima de quatro metros;

               IV – a largura máxima das edificações que utilizem o espaço aéreo sobre logradouros                         públicos não excederá a vinte metros, sendo ainda limitada pela testada de menor                                dimensão dos imóveis lindeiros.

 

Do ponto de vista urbanístico e de sua aplicação o PLC 96/2015 pode ser questionado item a item, por exemplo, quanto a situações subjetivas (compensa arrecadar à custa da paisagem urbana e da ocupação de espaços públicos?), ou a previsão antecipada de medidas “mitigadoras” e “compensatórias” (o que sugere a liberação de algo prejudicial), ou cobrar pela decisão de abrir janelas em empenas (ingerência em assunto de terceiros).

Por ora, bastam uma pergunta preliminar e uma sugestão, naturalmente, caso os aspectos jurídicos que parecem inviabilizar a aprovação, sejam superados.


A pergunta: por que a busca por terrenos da iniciativa privada para “implantação de áreas verdes e equipamentos públicos de uso comunitário em áreas carentes destas infraestruturas” e “criação de áreas de uso público de convivência em terrenos privados” e “regularização de ocupações em áreas públicas ou privadas” mediante benesses urbanísticas (aumento e/ou transferência de potencial construtivo e Área Total de Edificação – ATE), e incentivos à concessão de terrenos, pelos respectivos proprietários, para fins de regularização fundiária, ao mesmo tempo em que a atual gestão municipal se desfaz sistematicamente de áreas públicas, espaços de lazer, e imóveis Próprios Municipais para vendê-los à iniciativa privada?

A sugestão: que os interessados em conhecer e compreender as consequências da proposta peçam ao Executivo a apresentação de desenhos esclarecedores e cálculos percentuais de áreas de construção aumentadas.


Nota: o PLC 96/2015 não será votado em regime de urgência (regime de tramitação que não pode ser solicitado devido à natureza da proposta), mas poderá ser apreciado com pressa, a pedido do Executivo. Porém há muitos aspectos a serem esclarecidos. É um projeto de lei complementar complexo. A pressa não permitirá compreendê-lo com a profundidade necessária.

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