Cinema Roxy continuará sendo cinema. Ou não.

Cine Roxy, em Copacabana — Foto: Reprodução/reprodução

A Prefeitura do Rio, publicou uma decisão no Diário Oficial do Município desta quinta-feira, dia 17 de junho, na qual inclui o Cine Roxy, em Copacabana, na Zona Sul do Rio, no cadastro dos negócios tradicionais e notáveis da cidade. O Roxy agora faz parte da lista de bens imateriais do Rio, com o intuito de assim preservar o seu ramo de atividade. Em tese, quem comprar o imóvel, poderá até mudar o nome do clássico lugar, mas terá que manter o ramo de atividade como sala de cinema. Em tese…

Estamos diante de uma tentativa do governo municipal para manter o cinema, talvez interessante e, talvez, com um quê de demagogia. Explica-se: Não se tomba o uso de um imóvel nem a atividade nele exercida. O cinema foi tombado em 2003 o que significa que elementos morfológicos estão protegidos e devem ser mantidos no caso de obras de reforma ou adaptação para outros usos, conforme orientar o órgão de proteção do Patrimônio Cultural da Cidade do Rio de Janeiro.  A nova decisão, entretanto, poderá travar possíveis tentativas de venda e mudanças de uso/atividade, pois essas estarão sujeitas a questionamentos jurídicos.

O decreto no qual o Cinema Roxy já está incluído, em seu artigo 4º dispõe que “O órgão municipal de proteção do Patrimônio Cultural deverá buscar, em conjunto com outros órgãos das esferas municipal, estadual e federal e instituições de caráter privado, meios de incentivos à conservação das características de ambiência e manutenção das atividades dos bens declarados”. Pode ser um primeiro passo para que, ao contrário da notícia de hoje, a história do Cinema Roxy tenha um final feliz.

Curiosa e paradoxalmente, o mesmo prefeito revogou o tombamento do Cinema Leblon para permitir a construção de um empreendimento comercial. Essa espetacular casa de espetáculos não teve final feliz.

Abaixo, o decreto de 2014 e as duas reportagens publicadas no jornal O Globo.

Urbe CaRioca

Decreto nº 39.705 de 30 de dezembro de  2014 – Cria o cadastro dos negócios tradicionais e notáveis

O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela legislação em vigor e,

CONSIDERANDO as singulares características dos bens em questão que, por força de sua continuidade histórica e de sua relevância local, são parte do referencial cultural carioca;

CONSIDERANDO a necessidade de estabelecer políticas e incentivos para a valorização e conservação destes bens culturais da cidade, que passam por processo de transformação ou de desaparecimento;

CONSIDERANDO os estudos elaborados pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade – IRPH;

CONSIDERANDO o pronunciamento do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro, que consta no processo nº 01/005.828/2014, DECRETA:

Art. 1º Fica instituído o Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis, nos termos do art. 132, § 2º da Lei Complementar 111 de 1º de fevereiro de 2011 (Plano Diretor da Cidade Rio de Janeiro).

Art. 2º Ficam inscritos no Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis os estabelecimentos abaixo relacionados:

a) Ao Bandolim de Ouro – Avenida Marechal Floriano, 120 – Centro;
b) Chapelaria A Esmeralda – Avenida Marechal Floriano, 32 – Centro;
c) Chapelaria Alberto – Rua Buenos Aires, 73 – Centro;
d) Chapelaria Porto – Rua Senador Pompeu, 94, Sobrado – Centro;
e) Charutaria Syria – Rua Senhor dos Passos 180 – Centro;
f) Cofres Americanos – Rua Teófiio Otoni, 120 – Centro;
g) Cofres Gaglianone – Rua Teófiio Otoni, 134 – Centro;
h) Confeitaria e Restaurante Cirandinha – Avenida Nossa Senhora de Copacabana, 719 – Copacabana;
i) Confeitaria La Marquise – Rua Carvalho de Mendonça, 29 – Copacabana;
j) Gráfica Marly – Rua do Livramento, 40 – Centro;
k) Leiteria Mineira – Rua da Ajuda, 35, loja A – Centro;
i) Livraria Padrão – Rua Miguel Couto, 40 – Centro e;
m) Tabacaria Africana – Praça XV, 38 – Centro.

Parágrafo Único – O órgão executivo municipal de proteção do patrimônio cultural deverá realizar os estudos necessários à inscrição dos bens citados neste artigo no Livro de Registro dos Negócios Tradicionais e Notáveis, conforme estabelecem os Decretos Nº 23.162 de 21 de julho de 2003 e Nº 37.271 de 12 de junho de 2013.

Art. 3º O órgão executivo municipal de proteção do Patrimônio Cultural poderá promover o cancelamento da inscrição no Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis, caso o bem cultural não preserve as características marcantes que o identificaram como representativo desta categoria patrimonial.

Parágrafo Único – Caso se verifique que a hipótese é de cancelamento da inscrição do bem, o órgão executivo municipal de proteção ao patrimônio cultural deverá comunicar ao estabelecimento os fatos que justificam o cancelamento do cadastro e estabelecerá o prazo de 30 dias para a apresentação de defesa. Rejeitada a defesa, o cancelamento da inscrição será efetivado.

Art. 4º O órgão municipal de proteção do Patrimônio Cultural deverá buscar, em conjunto com outros órgãos das esferas municipal, estadual e federal e instituições de caráter privado, meios de incentivos à conservação das características de ambiência e manutenção das atividades dos bens declarados.

Art. 5º O enquadramento dos estabelecimentos no Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis autoriza a obtenção dos benefícios previstos na legislação pertinente, bem como outros incentivos que venham a ser criados.

Art. 6º Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 30 de dezembro de 2014; 450º ano da fundação da Cidade.

Eduardo Paes

Roxy continuará sendo cinema, decide a prefeitura do Rio, após rumores de venda (OG, 17/06/2021)

Rodrigo de Souza – O Globo (17 de junho de 2021)

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RIO — A Prefeitura do Rio de Janeiro decidiu preservar o ramo de atividade do Cine Roxy, em Copacabana, na Zona Sul, incluindo-o no o Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis da cidade, mesma lista à qual o restaurante La Fiorentina foi adicionado em maio, pouco antes de ser levado a leilão.

Assim, por lei, o cine passa a integrar a lista de bens imateriais da cidade. Na prática, isso significa que qualquer modificação no negócio, inclusive no ramo de atividade ao qual ele pertence, precisa ser autorizada pela prefeitura.

O imóvel em que o Roxy está instalado é tombado por decreto municipal desde 2003, o que proíbe alterações físicas no espaço sem o aval prévio do setor de patrimônio da cidade. Agora, no entanto, isso passa a valer também para o negócio ali desenvolvido, conforme o decreto publicado no Diário Oficial nesta quinta-feira.

No início deste mês, rumores deram conta de que o Cine Roxy, último remanescente dos tradicionais cinemas de rua de Copacabana, estaria encerrando as atividades definitivamente, segundo o colunista Ancelmo Gois. O imóvel, hoje administrado pela Kinoplex, estaria à venda por R$ 30 milhões, dando margem a especulações sobre mudanças na atividade econômica desenvolvida no local.

Ao GLOBO, a Kinoplex disse que não comenta o assunto no momento, mas que “ainda não foi tomada nenhuma decisão quanto ao fechamento definitivo”.

Com a nova determinação da prefeitura, a propriedade pode trocar de dono, mas não de ramo — não ao menos sem a autorização do município. O tombamento ainda permite que o dono do imóvel localizado na Avenida Nossa Senhora de Copacabana se inscreva em programas de incentivos e fomento, além de receber apoio a políticas de identificação, registro e salvaguarda para a continuidade do negócio.

O decreto descreve o Roxy como um “marco referencial na cultura cinematográfica da cidade” e um “marco da arquitetura e engenharia modernas”.

O Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), responsável pela listagem dos bens imateriais do Rio, disse que a inclusão do Roxy no Cadastro de Negócios Tradicionais e Notáveis “se deu por ser o cinema um bem singular de grande relevância para a cidade. O enquadramento do cinema na lista visa a garantir a sua continuidade histórica, uma vez que o cadastro leva em conta a necessidade de estabelecer políticas e incentivos para a valorização e conservação destes bens culturais que passam por processo de transformação ou de desaparecimento. Com o decreto, o estabelecimento pode se candidatar à obtenção de benefícios e incentivos para a manutenção do negócio”.

Mobilização de moradores

A decisão da prefeitura foi motivada pela mobilização dos moradores de Copacabana, que veem no Cine Roxy um sopro da antiga efervescência cultural do bairro. Nas últimas décadas, cinemas de rua tradicionais, como o Jóia, na Avenida Nossa de Copacabana, e o Rian, na Avenida Altântica, se fecharam por dificuldades financeiras decorrentes de um processo de transição no perfil da região, e que foram exacerbadas pela pandemia.

Na terça-feira, dia 15, a Sociedade Amigos de Copacabana enviou um ofício ao prefeito Eduardo Paes para pedir a inserção do cine no Cadastro de Negócios Tradicionais e Notáveis. Ao diretor da associação, Horácio Magalhães, Paes respondeu, por WhatsApp, que providenciaria a medida.

— Ficamos muito satisfeitos que o Roxy tenha sido adicionado à relação. O intuito do nosso pedido foi no sentido de preservar essa atividade cultural importantíssima para Copacabana e para a cidade do Rio — diz Horácio.

Relatos de moradores mostram, contudo, que o cenário de abandono registrado pelo GLOBO na semana passada se mantém e parece não ter data para acabar. Segundo Horácio, o painel onde são dispostos os cartazes de filmes no interior do cine foi esvaziado.

— A gente continua muito preocupado, porque não há um posicionamento oficial por parte da Kinoplex. Oficialmente, a gente ainda não sabe se o cinema vai ser fechado, mas tudo indica que sim, até por causa da movimentação ali dentro — afirma. — A manutenção do cine seria um belo presente de aniversário para Copacabana, que fará 129 anos no próximo dia 6.

Apesar de iniciativa da prefeitura, Roxy não deve ter um final feliz (OG, 17/06/2021)

Rodrigo de Souza – O Globo (17 de junho de 2021)

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RIO — O Grupo Severiano Ribeiro confirmou, na noite desta quinta-feira, o fechamento definitivo do Cine Roxy, em Copacabana, na Zona Sul. Responsável pela marca Kinoplex, que administra o Roxy, o grupo disse ver “com receio” a notícia sobre a inclusão do cinema no Cadastro de Negócios Tradicionais e Notáveis do Rio de Janeiro, que aconteceu hoje, por decreto municipal. Em nota enviada ao GLOBO, a administradora diz que “atrelar o imóvel à sua atividade não garante que a mesma será desempenhada pelo proprietário e nem poderia”.

Segundo o grupo, a decisão de fechamento do cinema foi “lamentada imensamente pelo grupo, que há alguns anos vinha lutando por sua sobrevivência”. Contudo, a escolha, diz a empresa, foi “totalmente pautada nos resultados que o cinema vinha apresentando”.

“É fato que, no decorrer dos anos, os cinemas sofreram inúmeras mudanças em suas características, sendo a principal delas a migração para os shoppings centers. Esse movimento se deu devido ao comportamento do próprio público, que, por questões de segurança, multiplicidade de serviços, como amplo estacionamento e outras conveniências, passou a preferir opções de entretenimento localizadas em shoppings. Desde então, os resultados dos cinemas de rua seguiram uma curva decrescente acentuada, tornando-os inviáveis economicamente”, diz o posicionamento. (Veja a nota abaixo na íntegra.)

O anúncio acontece no dia em que a Prefeitura do Rio decidiu preservar o ramo de atividade do Cine Roxy, em Copacabana, na Zona Sul, incluindo-o no o Cadastro dos Negócios Tradicionais e Notáveis da cidade, mesma lista à qual o restaurante La Fiorentina foi adicionado em maio, pouco antes de ser levado a leilão.

Assim, por lei, o cine passa a integrar a lista de bens imateriais da cidade. Na prática, isso significa que qualquer modificação no negócio, inclusive no ramo de atividade ao qual ele pertence, precisa ser autorizada pela prefeitura.

No início deste mês, rumores deram conta de que o Cine Roxy, último remanescente dos tradicionais cinemas de rua de Copacabana, estaria encerrando as atividades definitivamente, segundo o colunista Ancelmo Gois. O imóvel, hoje administrado pela Kinoplex, estaria à venda por R$ 30 milhões, dando margem a especulações sobre mudanças na atividade econômica desenvolvida no local.

A Kinoplex vinha mantendo silêncio sobre o assunto até agora. Com a nova determinação da prefeitura, a propriedade pode trocar de dono, mas não de ramo — não ao menos sem a autorização do município. O tombamento ainda permite que o dono do imóvel localizado na Avenida Nossa Senhora de Copacabana se inscreva em programas de incentivos e fomento, além de receber apoio a políticas de identificação, registro e salvaguarda para a continuidade do negócio.

Veja a nota do grupo na íntegra:

“O Grupo Severiano Ribeiro confirma o fechamento definitivo do Cine Roxy e vê com receio a notícia sobre a inclusão do cinema no Cadastro de Negócios Tradicionais e Notáveis do Rio de Janeiro, uma vez que atrelar o imóvel à sua atividade não garante que a mesma será desempenhada pelo proprietário e nem poderia.

A decisão de fechamento do cinema foi lamentada imensamente pelo grupo, que há alguns anos vinha lutando por sua sobrevivência, mas totalmente pautada nos resultados que o cinema vinha apresentando. É fato que, no decorrer dos anos, os cinemas sofreram inúmeras mudanças em suas características, sendo, a principal delas, a migração para os shoppings centers. Esse movimento se deu devido ao comportamento do próprio público, que, por questões de segurança, multiplicidade de serviços, como amplo estacionamento e outras conveniências, passou a preferir opções de entretenimento localizadas em shoppings. Desde então, os resultados dos cinemas de rua seguiram uma curva decrescente acentuada, tornando-os inviáveis economicamente.

O Grupo Severiano Ribeiro vem, durante anos, subsidiando a operação do Cine Roxy, que se tornou cada vez mais deficitária. Em 2019, antes da pandemia, por exemplo, o cinema alcançou um público muito aquém do esperado, ficando 43% abaixo da média do grupo. Com a pandemia, em março de 2020, todos os cinemas foram fechados e assim permaneceram por cerca de oito meses, o que gerou um prejuízo econômico incalculável ao Grupo, que, na ocasião, inclusive, manteve o difícil compromisso de conservar o emprego de todos os seus colaboradores e honrar obrigações financeiras altíssimas. E, até hoje, vem lutando por sua sobrevivência nesse momento de dificuldades econômicas nunca vividas e sequer imaginadas em 104 anos dedicados à exibição.

Em outubro de 2020, com a reabertura dos cinemas mais uma vez o Roxy demonstrou sua inviabilidade, agravada pela característica de ter um público predominantemente sênior. Isso fez com que recebesse, em uma semana, apenas 24 pessoas, o que corresponde a oito por sala em um dia inteiro de operação, obrigando o Grupo Severiano Ribeiro a fechar suas portas e hoje, sem condições de manter sua operação, fechar definitivamente.”

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