O caso e o ocaso do Hotel Glória em nome dos Jogos Olímpicos, de passado destruído, presente abandonado e futuro incerto, foi objeto de várias postagens neste espaço urbano-carioca. Para o Glória, quem sabe ainda reste uma fachada com o miolo refeito. História que muitos desconhecem é a que na década de 1980 seu irmão, o Hotel Copacabana Palace, por pouco não teve destino igual ou pior: dele nada restaria. É o que nos conta Maximiliano Zierer no artigo abaixo reproduzido. Cabe lembrar que, posteriormente houve nova tentativa de modificar o conjunto, quando seriam demolidos o Anexo e o Teatro, e mantido o prédio principal, projeto de outro famoso escritório de arquitetura, felizmente também sem êxito. Boa leitura.
Urbe CaRioca
Projeto de demolição do Copacabana Palace para a construção de cinco espigões
Maximiliano Zierer, 01/09/2018
Imaginem o Hotel Copacabana Palace, símbolo de Copacabana e da cidade do RiodeJaneiro, substituído por um complexo formado por cinco novos espigões? Imaginem o seu entorno com um movimento diário adicional de milhares de pessoas e de automóveis, isso em um bairro com o trânsito já sobrecarregado e com altíssima densidade populacional? Quem em sã consciência pensaria em construir cinco prédios no lugar de um icônico Hotel? Como ignorar o impacto dessas novas construções naquele local e a descaracterização arquitetônica da Avenida Atlântica? O lucro está acima de tudo? No início dos anos 80 os proprietários argumentavam que o velho prédio do Hotel Copacabana Palace era inviável comercialmente, e que, numa época em que já não havia terrenos disponíveis na orla de Copacabana, era necessário, em nome do progresso e da modernidade hoteleira carioca, botar no chão o velho, decadente e ultrapassado Hotel.
O projeto do arquiteto Paulo Casé, encomendado pela família Guinle e apresentado em 1980, previa a demolição do Hotel Copacabana Palace para a construção de cinco prédios que abrigariam um novo hotel, um shopping center, escritórios, apartamentos e duas áreas de lazer públicas: uma ao ar livre, ocupando o espaço atualmente ocupado pela piscina e pérgula do hotel, e a outra área de lazer seria fechada por uma claraboia, e serviria como acesso aos prédios, que teriam elevadores panorâmicos, em torres de vidro.
No mais alto dos espigões, com 37 andares, ficaria um centro empresarial com grandes escritórios. Outras duas torres de 25 andares cada abrigariam um hotel com 450 apartamentos no total – o dobro da capacidade atual – e um shopping center. Haveria ainda um prédio com 20 andares com 250 pequenos apartamentos (um pombal!) e outro prédio de 12 andares, com escritórios.
Vale lembrar aos amigos que o arquiteto carioca Paulo Casé é o mesmo que projetou o hotel Méridien, atual Hilton Copacabana (um espigão de 39 andares), e o Hotel Marriott, este último um dos edifícios mais feios da Avenida Atlântica – construído no local do castelinho da Veplan, que era a casa da família do Conde Dias Garcia – além do famigerado obelisco de Ipanema, erguido no cruzamento da Rua Visconde de Pirajá com a Avenida Henrique Dumont, bem próximo ao Canal Jardim de Alah. O obelisco foi alvo de reclamações desde a sua construção. À época, foi erguido também um pórtico para marcar a divisa entre Ipanema e Leblon, também um projeto do Paulo Casé. Mas, segundo os moradores, aquela espécie de passarela ligava nada a lugar algum. O pórtico foi demolido em 2009, no início do mandato do prefeito Eduardo Paes, mas o obelisco ficou.
A polêmica da demolição do Hotel Copacabana Palace movimentou várias entidades, as quais se posicionaram contrárias ao projeto, como o Conselho Estadual de Cultura e a Federação das Associações de Defesa do Meio Ambiente. Essa última encabeçou, em 1982, uma ação popular na Justiça Federal que pedia o tombamento do Hotel, como medida necessária ao resguardo do patrimônio público. A ação trazia 20 mil assinaturas de moradores de Copacabana, incluindo a do arquiteto Oscar Niemeyer. Para a alegria dos moradores de Copacabana e do Rio de Janeiro, essa história teve um final feliz: o absurdo projeto do arquiteto Paulo Casé divulgado em 1980 com os seus cinco espigões não foi adiante. Após a pressão de vários setores da sociedade, o Copacabana Palace tornou-se patrimônio histórico, sendo tombado nas esferas federais (IPHAN), estadual (INEPAC) e municipal (SEDREPAHC). Em 1989, a família Guinle, na pessoa de José Eduardo Guinle, vendeu-o ao grupo Orient Express, hoje Belmond, que reabilitou o Hotel Copacabana Palace, modernizando as antigas instalações sem descaracterizá-las. Assim, o Hotel Copacabana Palace, marco histórico do Rio, foi preservado e se encaminha para comemorar o seu centenário, daqui a 5 anos. O projeto do Hotel, inaugurado em 1923, é de autoria do arquiteto francês Joseph Gire, e foi encomendado pelo empresário Octávio Guinle. A inspiração veio de dois hotéis famosos na Riviera Francesa: o Negresco, em Nice, e o Carlton, em Cannes. Suas linhas clássicas em simetria e equilíbrio remetem a luxo e glamour, além de tornar o monumento singular e expressivo em meio ao conjunto linear de edificações residenciais na Avenida Atlântica.
A primeira foto é o anúncio da inauguração do Hotel em agosto de 1923, publicada na edição da revista Fon Fon de 18-8-1923. A segunda foto é de 1922 e mostra o Hotel ainda em suas obras de conclusão e acabamento, foto de autor desconhecido. A terceira foto, também de autor desconhecido, mostra os efeitos da forte ressaca de 1923 que destruiu a pista da Avenida Atlântica na altura do Hotel. A quarta foto, de autor desconhecido, é de 2018 e mostra o Belmond Copacabana Palace – seu nome atual – muito bem preservado, com os seus 95 anos de idade. Praticamente um menino!
P.S: Nossas condolências pelo falecimento do arquiteto Paulo Casé, aos 87 anos de idade, no último dia 27-08-2018.
Texto e pesquisa de Maximiliano Zierer – Fontes: Jornal do Brasil, Veja Rio e Wikipédia; Imagens publicadas pelo autor do artigo em rede social.