Sancionada na última semana, a nova lei de mais valia com regras para legalizar puxadinhos na Cidade do Rio de Janeiro é alvo de polêmica desde que o projeto ainda tramitava na Câmara dos Vereadores.
Enquanto a Prefeitura tenta se justificar afirmando que, com a entrada em vigor do novo Plano Diretor, seria preciso um mecanismo que permitisse regularizar os acréscimos, especialistas criticam o projeto por entender que construções acima do gabarito podem descaracterizar os bairros e levar a um adensamento excessivo.
Os reflexos sobre o trânsito e a própria infraestrutura urbana existente podem ser imensos. Além disso, acrescentam que a lei tem apenas o intuito de fazer caixa já que a Prefeitura estima arrecadar até R$ 600 milhões com as taxas até o fim do ano.
Abaixo, nova matéria publicada pelo jornal O Globo sobre a questão.
Urbe CaRioca
Mais valerá: entenda os impactos da nova lei dos puxadinhos na cidade
Proposta põe em lados opostos prefeitura e especialistas em arquitetura e urbanismo
Por Luiz Ernesto Magalhães – O Globo
Sancionada na quinta-feira (18) pelo prefeito Eduardo Paes, uma nova lei de mais valia. As regras para legalizar puxadinhos preveem o pagamento de taxas para a prefeitura até para regularizar obras que sequer foram construídas. A regulamentação da lei, detalhando os próximos passos para regularizar os acréscimos, será divulgada nos próximos dias. Mas o tema é alvo de polêmica desde que o projeto ainda tramitava na Câmara dos Vereadores.
A prefeitura sustenta que com a entrada em vigor do Plano Diretor em janeiro, era preciso que existisse um mecanismo que permitisse regularizar os puxadinhos, seguindo diretrizes que orientarão a expansão da cidade nos próximos dez anos. Especialistas, porém, criticam o projeto por entender que construções acima do gabarito podem descaracterizar os bairros e levar a um adensamento excessivo, gerando impactos sobre o trânsito e a própria infraestrutura urbana existente, como serviços de luz, gás e água, por exemplo. E que a lei tem apenas o objetivo de fazer caixa já que a prefeitura estima arrecadar até R$ 600 milhões com as taxas até o fim do ano.
— O novo Plano Diretor estabeleceu parâmetros urbanísticos e regras para a cidade. Só será possível legalizar projetos dentro de determinados parâmetros que os técnicos da prefeitura avaliam que não trarão reflexos negativos. Isso inclui legalizar projetos de acréscimos que possam causar sombras na areia da praia ou desrespeitem a legislação ambiental. Por questão de justiça, oferecemos essa oportunidade tanto para quem está construindo quanto para quem quer se regularizar — disse o secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Planejamento, Chicão Bulhões.
Ainda durante a tramitação do projeto, o Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RJ) encaminhou ofício à Câmara do Rio criticando o projeto, por desvirtuar qualquer legislação que trate do planejamento da cidade, como o Plano Diretor. Nesta quinta-feira, a entidade voltou a se manifestar por nota.
”’No Rio de Janeiro, a legalização de construções irregulares, mediante pagamento de contrapartida tornou-se um procedimento comum (…). Ao alterar as normas urbanas para atender a interesses pontuais, o poder público abre mão de sua atribuição de planejar e ordenar o uso do solo urbano”, diz trechos da nota.
O professor de arquitetura do Ibmec, Marco Milazzo, também é um crítico da nova lei:
— O foco principal não é o planejamento urbano, mas a arrecadação. E a cidade tem que ser vista de forma integrada. Um dos maiores absurdos é um dispositivo que permite construir mais de um andar extra nos bairros do Catete e da Glória, que têm construções mais baixas porque elas ajudam a contar a história da origem e ocupação desses bairros. Além disso, as ruas são antigas e estreitas. Nada foi levado e, conta — disse Marco.
Chicão Bulhões rebateu as críticas:
— Essa lei segue as diretrizes do Plano Diretor. Um dos objetivos é dar mais opção para se morar em áreas mais consolidadas da cidade. Sem isso, o Rio continuaria com uma expansão acelerada para a Zona Oeste — disse o secretário.
Outras leis
A aprovação de leis que legalizam puxadinhos estabelecendo prazo para regularização dos acréscimos é comum desde os anos 1990.O Rio já teve outras regras em vigor para o mais valerá, mas são bem mais recentes Dispositivo semelhante foi aprovado durante o governo do ex-prefeito Marcelo Crivella (2017-2020) mas a lei foi julgada inconstitucional pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. O entendimento era que o texto estava em desacordo com o antigo Plano Diretor.
Em 2023, já no governo Paes, outra lei com o mesmo teor foi aprovada, mas vigorou por apenas por cerca de dez meses, até a entrada em vigor do novo Plano Diretor.
Conheça as regras:
O que é cobrado: Uma taxa equivalente a área em metros quadrados que quer se regularizar. Esse valor varia conforme a área da cidade e o metro quadrado de cada região
E se o contribuinte não pagar: Haverá a cobrança de juros de 1% ao ano e inscrições na Dívida Ativa, e no cadastro dos órgãos de proteção ao crédito e cobrança mediante execução fiscal.
Prazos: No caso do mais valerá, as autorizações só serão dadas para projetos protocolados na prefeitura até 1º de dezembro deste ano. No caso da mais valia, a validade é de três anos.
O que pode ser legalizado: Como regra geral, permite construir um andar adicional ou metade disso, em partes da Barra e do Recreio. Na Glória e no Catete, os puxadinhos poderão ter dois ou mais pavimentos passíveis de legalização. Isso porque a referência para aprovar acréscimos em prédios mais altos será a construção mais alta de cada quadra.
O que não pode ser legalizado: Em nenhum caso, será permitido legalizar obras em áreas de proteção ambiental e na proximidade de imóveis históricos, sem que os órgãos de proteção sejam ouvidos. Em toda orla, os acréscimos só serão legalizáveis se as edificações não projetarem sombras na areia.
Hotéis: Autoriza, mediante o pagamento de contrapartidas, a conversão de hotéis em prédios residenciais. Mas há exceções. Não será concedida licença se o hotel tiver frente para a orla marítima. No caso da Barra e do Recreio, a restrição se estende aos hotéis localizados em toda a quadra da orla.
Varandas: No caso da Barra, autoriza o fechamento parcial das varandas. Onde for permitida varanda em balanço , com cinco metros de profundidade, por exemplo.
Templos religiosos: Estão isentos do pagamento da taxa