A demolição de qualquer edificação na Cidade do Rio de Janeiro depende de licença da Prefeitura. No caso de prédios construídos até o ano de 1937 as licenças para demolir são submetidas previamente ao Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural. O mecanismo, criado em 1990, tem a finalidade de detectar construções de interesse cultural – em sentido amplo – o que pode levar a ações para a preservação desses bens, seja através do tombamento, em geral quando há valor individual, ou da criação das Áreas de Proteção do Patrimônio Cultural – APAC, quando há existem conjuntos arquitetônicos relacionados à memória urbana histórica, cultural, ou mesmo afetiva para determinada coletividade.
O ano 1937 refere-se à primeira consolidação das normas para edificar no então Distrito Federal e Capital da República, o que não impede que construções mais recentes venham a ser também objeto de proteção, a exemplo do que ocorreu com um grupo de prédios modernistas de 1950/1960, e vários outros de estilo art-decó posteriores a 1937.
O Complexo do Maracanã, Estádio de Futebol ícone do Rio e do Brasil, foi tombado em 2000 pelo governo federal e em 2002 pelo governo municipal. No último foram incluídas as “demais construções que integram o complexo desportivo instalado no local”, pois “constituem conjunto de grande importância histórica, arquitetônica, cultural e afetiva para a Cidade do Rio de Janeiro”. Portanto, além do Estádio Mário Filho (Maracanã) foram protegidos o Ginásio Gilberto Cardoso (Maracanazinho) a Pista de Atletismo Célio de Barros, e o Parque Aquático Júlio Delamare.
Note-se que todos os equipamentos, tutelados pelo governo estadual por herança do antigo Estado da Guanabara, foram reformados para a realização dos Jogos Pan-americanos de 2007, à custa de muitas verbas públicas.
Mas, após a inexplicável autorização do próprio IPHAN mesmo diante do tombamento de sua própria alçada em 2000 – leia-se: governo federal -, a marquise, obra espetacular do concreto armado e orgulho da engenharia nacional, foi abaixo junto com praticamente todo o estádio, do qual restou apenas parte da carcaça, exalando o mau cheiro de práticas, no mínimo, questionáveis.
Tudo feito pelo governo estadual com a cúmplice omissão da prefeitura. Afinal, já foi dito que “tudo é prá Olímpíada” mesmo que nada tenha a ver com Olimpíada…
“Esse negócio de Olimpíada é sensacional prá você usar como
desculpa prá tudo. Então tudo que eu tenho que fazer, agora
vou fazer prá Olimpíada, fazer prá Olimpíada. Tem coisa
que tem a ver com Olimpíada, tem coisa que não tem nada a ver, mas eu uso”.
Prefeito Eduardo Paes em 14/10/2012
Dizem que o Estádio ficou lindo. É outro, é claro. O Gigante não existe mais. É História em fotos, filmes e lembranças.
O que fizeram foi pouco.
Com a marquise iriam abaixo o parque aquático e a pista de atletismo, condição para atender ao consórcio que administrará o Maraca, criando espaço para construir prédios novos que rendessem grandes lucros: edifício-garagem, e atividades comerciais diversas. Para tanto, foram destombados pelo prefeito dias após ter sido reeleito.
Houve mais ainda. A demolição do Antigo Museu do Índio, Patrimônio Cultural Carioca na opinião deste blog, foi autorizada pelo prefeitoque desconsiderou o parecer do Conselho de Patrimônio favorável à sua preservação e restauro.
ANTIGO MUSEU DO ÍNDIO, MARACANÃ Foto: O Globo |
Tudo decidido, embora diversas ações na Justiça tentassem impedir o bota-abaixo, mais desperdício de dinheiro público, e grupos de manifestantes lutassem contrariamente.
E eis que, em junho, a população foi às ruas pelos mais diversos motivos com um rol de reinvindicações…
… e os índices de popularidade dos governantes despencaram.
… e os índices de popularidade dos governantes despencaram.
Primeiro vieram as des-demolições dos equipamentos públicos desportivos, anunciadas pelo governador após ‘refletir’, como contamos em VOU DEMOLIR! HUMMM… REFLETI… NÃO VOU DEMOLIR, quando pedimos que também refletissem – ele e o alcaide afilhado, sobre o Quartel da PM da Rua Evaristo da Veiga.
Quanto ao QG dos Barbonos, a venda está suspensa temporariamente.
O Antigo Museu do Índio não apenas foi poupado pelo governador como, ontem, surpreendentemente, foi tombado PELO PREFEITO, tal como o Parque Aquático Julio Delamare e o Estádio de Atletismo Célio de Barros, antes condenados com veemência, foram destombados e agora des-destombados!
Até a Escola Municipal – que não precisava ser tombada, diga-se, bastava deixá-la, e aos pais e alunos, sossegados – foi alvo das reflexões preservacionistas.
Tantas bondades nos dão alívio e nos encorajam a pedir mais: preservar e elaborar um projeto urbanístico para a cidade no sítio histórico do Quartel, construir praças em Botafogo em frente ao Palácio da Cidade e em frente ao Morro Dona Marta, cancelar o Campo de Golfe, garantir a continuidade da Avenida Prefeito Dulcídio Cardoso, e deixar a Marina da Glória em paz, providenciando ou exigindo sua gestão adequada, tudo mencionado citado post.
No caso da Prefeitura, por exemplo, desistir de: pôr abaixo o Velódromo construído com dinheiro público – o que causou espanto até no arquiteto que o projetou; criar índices urbanísticos para o Parque do Flamengo, onde a construção de Shopping e Centro de Convenções na Marina da Glória também foi suspensa após o clamor da sociedade e, é claro, das ações judiciais; e impedir a continuidade da APA Marapendi e da Avenida Prefeito Dulcídio Cardoso para favorecer a construção civil e criar um questionável Campo de Golfe.
Que venham muitos “Brainstorms” e mea-culpa, com a ajuda das ruas, das ações judiciais e das providenciais pesquisas de aprovação dos governos.
Abaixo, os decretos citados e suas modificações.
Internet |
O TOMBAMENTO
DECRETO nº 21.677, de 03 de julho de 2002
Determina o tombamento dos bens que menciona e dá outras providências.
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO DE JANEIRO, no uso de suas atribuições legais, e tendo em vista o que consta no processo n.º 01/004.592/98,
CONSIDERANDO o pronunciamento unânime do Conselho Municipal de Proteção do Patrimônio Cultural do Rio de Janeiro;
CONSIDERANDO a necessidade de preservar o Estádio Jornalista Mário Filho – Estádio do Maracanã, um dos mais representativos símbolos da Cidade do Rio de Janeiro;
CONSIDERANDO que o MARACANÃ e demais construções que integram o complexo desportivo instalado no local constituem conjunto de grande importância histórica, arquitetônica, cultural e afetiva para a Cidade do Rio de Janeiro;
CONSIDERANDO tratar-se de bem cultural que é referência da História do Futebol Brasileiro e Mundial,
D E C R E T A :
Art. 1.° Ficam tombados definitivamente, nos termos do art. 1.°, da Lei n.° 166, de 27 de maio de 1980, o Estádio Jornalista Mário Filho, denominado Estádio do Maracanã, e as demais edificações que integram o complexo desportivo existente no local, que compreendem o Ginásio Gilberto Cardoso (Maracanãzinho), o Estádio Célio de Barros e o Parque Aquático Júlio Dellamare.
Art. 2.° Quando necessário, serão admissíveis obras de modernização do Estádio da Maracanã, bem como das outras edificações de que trata o presente decreto.
Art. 3.° As obras referidas no artigo anterior deverão ser orientadas pelo órgão de patrimônio cultural do Município responsável pela tutela do Bem Tombado.
Art. 4.° Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 3 de julho de 2002 – 438.° de Fundação da Cidade.
CESAR MAIA
D.O. RIO de 4.07.2002
O DESTOMBAMENTO
DECRETO Nº 36349 DE 19 DE OUTUBRO DE 2012
Determina o destombamento dos bens que menciona.
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas atribuições legais;
CONSIDERANDO o disposto o art. 6, I, da Lei nº 166 de 27 de maio de 1980;
DECRETA:
Art. 1º. Fica sem efeito o tombamento definitivo do Estádio Célio de Barros e do Parque Aquático Júlio Dellamare, de que trata o Decreto nº 21.677 03 de julho de 2002.
Art. 2º. Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Rio de Janeiro, 19 de outubro de 2012; 448º ano da fundação da Cidade.
EDUARDO PAES
D.O. RIO de 22.10.2012
O DES-DES-TOMBAMENTO
DECRETO Nº 37529 DE 9 DE AGOSTO DE 2013
Torna sem efeito o Decreto nº 36.349, de 19 de outubro de 2012.
O PREFEITO DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pela legislação em vigor e
DECRETA:
Art. 1º. Torna sem efeito o Decreto nº 36.349, de 19 de outubro de 2012.
Art. 2º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Rio de Janeiro, 9 de agosto de 2013; 449º ano da fundação da Cidade.
EDUARDO PAES
D.O. RIO de 12.08.2013
Obrigada, André, mas os parabéns devem ser dirigidos a você! Um grande abraço. Andréa
Excelente a abordagem! Parabéns Andrea! Abrçs, André Ordacgy.