Os absurdos urbano-cariocas prosseguem. Não bastando a concessão eterna para exploração de um dos maiores ícones do Brasil – é carioca – o pedido de expansão das construções deve ser engavetado para sempre. Ou, será “o bode na sala” para justificar a Tirolesa sem pé nem cabeça, fora de lugar para dizer o mínimo.
Não se trata apenas de aprovações pelos órgãos de Patrimônio Cultural e outros de proteção da paisagem. Há que analisar a conveniência. É do que a cidade precisa? É o que a cidade quer? O papel dos governantes é carrear recursos da iniciativa privada que deseja investir no Rio de Janeiro conforme prioridades para a cidade e sua população e não simplesmente abraçar ideias mirabolantes e, muitas vezes, prejudiciais. Vide a permissão, em curso, para usufruir o Jardim de Alah.
Urbe CaRioca
Empresa responsável pela tirolesa no Pão de Açúcar pede mais de 50% de acréscimo na área do morro para realizar outro projeto
De acordo com os órgãos licenciadores, o plano de construção ainda está em análise técnica inicial; iniciativa preocupa arquitetos e ambientalistas
*Reportagem do estagiário Leonardo Marchetti, sob supervisão de Thiago Antunes
Publicado originalmente no O Dia
Rio – A Índio da Costa A.U.D.T, responsável pela construção da tirolesa nos morros da Urca, apresentou outro projeto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) pedindo 50,16% de acréscimo da área total do Pão de Açúcar, para realizar o chamado “Plano Diretor” do empreendimento. No entanto, o projeto também engloba o Morro da Urca e a Estação da Praia Vermelha, onde a empresa solicita um acréscimo de 47,96% e 54,36%, respectivamente, da área total construída. A iniciativa preocupa ambientalistas e arquitetos.
A proposta do projeto para o Morro da Urca é referente a um espaço com diversas atividades, como passarelas, restaurantes, teatros, elevadores e mirantes. Neste, a empresa pede um acréscimo de 47,96% da área construída, protocolado pela Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar (CCAP) no Iphan.
O estudo preliminar para o plano na Estação da Praia Vermelha foi apresentado pelos arquitetos Indio da Costa, Rafaela Macedo e Carlota Sampaio e o Iphan aprovou o documento, mas o anteprojeto deverá passar pela análise de outros órgãos. Este projeto, que pede 54,36% de acréscimo na área, pretende construir edificações “com decoração paisagista” pois, de acordo com o parecer técnico, “suavizará o impacto da edificação [tombada] na paisagem”.
Segundo o arquiteto Sérgio Alvim, as obras deste projeto vão descaracterizar os morros e causarão uma degradação no ambiente natural. “A área construída já atende perfeitamente ao que foi definido e tombado. Não existe crescimento infinito, amanhã vão querer mais área sob qualquer argumento”, afirmou o arquiteto.
De acordo com o Iphan e com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação do Rio (SMDEIS), o chamado “Plano Diretor” está nos trâmites iniciais de análise e “à espera dos pareceres de todos os órgãos envolvidos no processo para a concessão ou não do licenciamento”. O Monumento Natural dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca foi tombado em 1973 como patrimônio histórico da cidade pelo Iphan e não pode sofrer descaracterização ou qualquer intervenção neste ambiente, sem obedecer a rígidos critérios exigidos por órgãos reguladores e licenciadores competentes.
O CEO do Parque Bondinho, Sandro Fernandes, disse que a imagem que está viralizando no cume do Pão de Açúcar retrata uma volumetria exagerada, já que no projeto os arquitetos retiram toda a vegetação do local. “As pessoas acham que vai ser um shopping. Desculpa, não é um shopping”, disse Fernandes ao DIA. Ainda sobre o projeto, Sandro afirmou que os acréscimos pedidos são para platôs visando maior acessibilidade.
O ambientalista, montanhista e co-fundador do Grupo Ação Ecológica (GAE), André Ilha, disse que a tirolesa no morro passa a ser um detalhe secundário, pois neste “Plano Diretor” existe um grande acréscimo de área ocupada. “Haverá um impacto visual gigantesco no Pão de Açúcar, alguns chamam de ‘Castelo dos Horrores’. Do ponto de vista arquitetônico, muitos podem achar bonito, mas é inapropriado para este lugar”, ressaltou André.
Em nota, o Parque Bondinho afirmou que, atualmente, as únicas obras em curso nos morros da Urca e do Pão de Açúcar são referentes exclusivamente ao projeto da tirolesa e que o Plano Diretor se encontra em fase de estudo.
A arquiteta Paloma Yamagata, disse que o Pão de Açúcar é um espaço de contemplação e não precisa de um projeto como este. “Não é esta a vocação do Pão de Açúcar. O projeto é desproporcional para os morros”, afirmou.
A reportagem vem procurando a empresa Indio da Costa A.U.D.T há duas semanas e ainda não obteve resposta. O espaço segue aberto para manifestação.
Vídeo publicado originalmente no G1
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Comentário de Cládio Prado De Melo – Arqueólogo e incansável defensor do patrimônio cultural
Eu não estou entendendo nada !
Bem ! Todo mundo sabe que eu sou hiper partidário de avanços no Turismo e no melhoramento dos lugares para exploraçao turistica, desde que nao danifique e nem comprometa o Patrimonio Histórico. Eu sinceramente estou preocupado com a questão do Pão de Açúcar. Temos no Rio de Janeiro um tombamento mundial da Unesco que preserva o Rio como Paisagem e isso acaba sendo muito sério !
Lembro na época em que apareceram com a ideia do Memorial do Holocausto no Morro do Pasmado, o arquiteto responsável do órgao gestor federal elencou uma série de observações e restrições e passado um tempo tudo foi flexibilizado e fizeram o monumento. Eu não falei nada na época porque achei que não afetava muito e lá no fundo fui favorável à construçao do monumento apesar de estar preocupado com a perda do titulo da Unesco.
Na época em que eu estava Diretor Geral do Inepac, apareceu um grupo querendo fazer uma tirolesa na pedra do Pontal de Sernambetiba. Nesse caso, com o local sendo tombado pelo Estado, encontrariam dificuldades na aprovação, mas apesar de conspurcar a paisagem e acabar alterando o local significativamente, eu achava que um projeto como esse iria dar uma visibilidade ao Recreio que seria muito oportuna, potencialmente puxando o turismo nacional e internacional para lá e então eu fui ( a princípio ) “simpático à ideia” no início e antes de ver o projeto . Mas não soube de nada depois e acho que o CET deve ter indeferido a ideia e o assunto morreu .
Mas no caso desse projeto de tirolesa no Pão de Açúcar eu acho complicado pelo volume em potencial de fluxo turístico que será excessivo. O que tenho visto do projeto inicial, creio que a alteração do que já tem não será muito significativa e o fato de fazerem perfurações na rocha certamente naã causará dano geológico .
Mas o que preocupa mesmo é o fato de uma “Paisagem Tombada” a partir de um processo de tombamento estar sendo adulterada apenas por fins financeiros e promocionais . O resultado disso tudo a gente já sabe, nao é ?
Neste projeto impressiona a falta de cuidados dos órgãos. Se a tirolesa for bom para o turismo, então vai aumentar o fluxo de turistas, mas isto está sendo negado pelos empreendedores. Como é possível que a prefeitura deixa passar essa incongruência sem qualquer estudo sério e embasado em números? Como é possível que ela aprova o projeto sem aprovação pelo Conselho Gestor do MoNa Pão de Açucar?
Pelo lado do Iphan, o mesmo descuido: a característica da paisagem do Rio é curvilínea. As plataformas de saída e chegada da tirolesa são planas, quebrando a característica. Como é possível que o Iphan não cobra nem sequer um desenho de como será a vista dos morros após a instalação, a partir de diferentes pontos de vista (Flamengo, Praia Vermelha, Copacabana)?
Minha filha esteve lá em dezembro de 2022 com o namorado quando vieram da Italia. Ao invés de chegarem em casa elogiando a paisagem, ouvimos as queixas: “Estão acabando com o lugar! O paisagismo está cedendo lugar ao comércio de todo tipo, especialmente de joias!”