“Esses projetos não foram adiante, lamentando-se apenas não ter prosperado a ideia de criar uma praça. Agora, recorre-se à mesmice de liberar outro empreendimento imobiliário em bairro saturado, enquanto algumas áreas remanescentes das desapropriações do Metrô, mais adequadas à ocupação, permanecem sub-utilizadas, e a Zona Portuária implora por habitação.”
Trecho de Vendo o Rio, 2018 – o terreno da antiga Cia. Ferro-Carril Jardim Botânico (Urbe CaRioca, 10/01/2018).
Há dois meses lamentamos profundamente a venda, pelo governo do Estado do Rio de Janeiro (isto é, pelos mesmos gestores que levaram esse Estado federado à penúria em meio a escândalos de corrupção), de um enorme terreno situado no bairro do Flamengo, entre as ruas Dois de Dezembro, Machado de Assis e a Rua do Pinheiro.
No post Vendo o Rio, 2018 – o terreno da antiga Cia. Ferro-Carril Jardim Botânico (Urbe CaRioca, 10/01/2018) apresentamos um breve histórico sobre a ocupação daquela área e um levantamento dos Projetos de Alinhamento e Loteamento que vigeram para o local e tivemos a grata surpresa de descobrir que um dia fora destinado à implantação de uma praça, exatamente o proposto por este Urbe CaRioca! Infelizmente, em outra ocasião, governantes também cogitaram a construção de um terminal rodoviário ali. Hoje, o prolongamento da Rua Arno Konder poderia ser interessante do ponto de vista do desenho urbano: foi cancelado.
Conforme previsível, o condomínio-mesmice já está sendo oferecido ao mercado. Ironicamente será vizinho do Instituto de Arquitetos do Brasil IAB-RJ, instituição que em tese defende os bons projetos urbanos e de arquitetura. Neste caso, defendeu a manutenção de sua sede, pois, de início, a belíssima construção seria vendida dentro do pacote do governo estadual de benesses ao mercado imobiliário e, possivelmente, demolida. Portanto, um aspecto positivo dentro do quadro… E da quadra a ser violada.
Serão erguidas duas torres (adiante comentaremos a questão dos gabaritos, sempre eles!) com 20 andares cada, sendo 17 para uso residencial, um de partes comuns, e dois com lojas e estacionamento. Somando-se lojas e apartamentos, as torres abrigarão 486 unidades com aproximadamente 50,00m² e 60,00m² de área útil, cada, correspondentes a 40,00m² e 50,00m² se descontado o espaço de simpáticas varandinhas. Note-se que as residências são menores do que alguns apartamentos populares oferecidos pelo programa Minha Casa Minha Vida, prevendo-se até quartos com largura de 2,00m. Os preços, entretanto, não serão nem um pouco populares!
Quanto à altura dos edifícios, a análise é simples: ao invés de restringir-se à periferia da quadra com gabarito de cerca de 10 andares para edifícios contíguos uns aos outros, mantido o centro da quadra non-aedificandi conforme prevê a lei vigente, a gestão municipal reverteu a norma para permitir torres mais altas, com o dobro da altura padrão no bairro – estabelecida em lei urbanística e limitada ao perímetro da quadra, vale repetir – presenteando empreendimento (e empreendedores) com vista panorâmica a partir dos andares superiores ao número comum no bairro, em detrimento da harmonia no conjunto urbano edificado, na paisagem urbana, e, possivelmente, obstruindo as visadas a partir de alguns imóveis existentes na vizinhança.
Quanto ao cancelamento do prolongamento projetado da Rua Vitor Konder, a única explicação plausível é a Prefeitura ter garantido mais dois acessos ao empreendimento – pelas ruas Dois de Dezembro e do Catete – e um correr de lojas no trecho da Rua do Catete que constituiria um terreno separado da porção maior onde foram projetadas as duas torres.
Ainda neste aspecto – acessos – é importante ressaltar que o empreendimento será responsável por despejar mais 487 veículos nas ruas do bairro (número que aumentará considerando-se a rotatividade inerente ao uso comercial), e que a entrada e saída de veículos ficará na hoje pacata Rua do Pinheiro, ligação entre as ruas Dois de Dezembro e Machado de Assis, que antes de 1978 chamava-se Beco do Pinheiro: a caixa da rua tem 10,00m de largura e previsão de alargamento para 12,00m, o que não ocorrerá, tanto devido à presença de prédio antigo situado na esquina com a Rua Machado de Assis, sem recuo e sem afastamento frontal conforme leis da época, quanto ao do próprio prédio da antiga Companhia Ferro-Carril Jardim Botânico, hoje sede do calado IAB-RJ.
Moradores do Flamengo, Catete, Largo do Machado e Laranjeiras posicionaram-se contrariamente ao número de andares do empreendimento e fazem circular um abaixo-assinado nas redes sociais através do qual pretendem “Demonstrar nossa insatisfação e solicitar a construtora que altere o projeto para um gabarito adequado à vizinhança; Acionar a justiça solicitando a imediata suspensão das vendas de unidades (principalmente as de gabarito superior) e um Estudo de Impacto de Vizinhança para adequação do projeto”.
Nesse contexto, prejudicar a visão do painel artístico vizinho é o menor dos problemas.
O link para o abaixo-assinado está AQUI.
Quando conhecerem outros detalhes sobre o projeto e as leis urbanísticas vigentes, provavelmente os moradores providenciarão novo abaixo-assinado para pedir o cancelamento da estranha licença de obras, suposta e inexplicavelmente concedida. E, quem sabe, pedir que se restaurem o prolongamento da Rua Vitor Konder e a destinação anterior do imóvel: a construção de uma praça.
Urbe CaRioca
Gostaria de ter informações por favor sobre o projeto de condomínio na rua Paulo VI (próximo ao metrô FLAMENGO), onde fica(va) o orfanato Educandário Romão Duarte, ao que parece propriedade da Santa Casa da Misericórdia. Muito grata !