Semana do Meio Ambiente – A importância das áreas verdes em uma cidade, de Hugo Costa

Neste artigo, o geógrafo Hugo Costa, tendo como ensejo a Semana do Meio Ambiente, faz uma profunda análise sobre a importância das áreas verdes em uma cidade, seus efeitos e repercussões no dia a dia e no bem estar da população, sobretudo das crianças.

“Não adianta ter uma enorme floresta em alguns `cantos´ (geográficos) do município e o resto da cidade sem áreas verdes. Os efeitos de controle térmico (ilhas de calor) e de poluição (atmosférica) não se estendem muito além das fronteiras desta área verde”, destaca.

Urbe CaRioca

O que é, o que é?

Hugo Costa, geógrafo

“Eu fico com a pureza da resposta das crianças” é um dos versos da música “O que é, o que é?” de Gonzaguinha e parece uma introdução interessante ao tema que tratamos aqui: a Cidade do Rio de Janeiro em números; Áreas de Lazer, Áreas verdes e Síndrome Respiratória Aguda Grave. Como? Vamos falar tema por tema.

Antes, uma nota introdutória. Muitos me questionaram o porquê de escrever sempre somente sobre a Zona da Leopoldina (Regiões Administrativas de Ramos e Penha) na Zona Norte carioca. Então, neste texto, não falarei sobre esta região, mas não sou responsável pelas óbvias conclusões sobre a geografia dos dados que a seguir.

1. Áreas de Lazer: Começaremos por um texto que todo brasileiro tem a obrigação de conhecer:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, O LAZER, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988).

O lazer é um direito constitucional de todo cidadão brasileiro e, principalmente, dos brasileirinhos! Tamanha é a importância das crianças na visão de vida urbana que vem se discutido no urbanismo a busca do desenvolvimento das cidades que sejam boas para as crianças

O mercado imobiliário e a sua capacidade de absorver necessidades e transformar em produto já pratica, há décadas, a oferta de condomínios com infraestrutura completa, tendo em seus folhetos comerciais como seu principal ativo o “lazer completo”, antes de falar em segurança e outros atributos quaisquer. Quando usamos o termo ‘local infraestruturado’ para receber moradores, talvez seja isto o que deva também ser levado em consideração.

A oferta do lazer em uma cidade se dá de diversas formas; cinemas, teatros, clubes de atividades, playgrounds privados, praças e parques públicos, sendo estes dois últimos as formas mais democráticas de se ter uma cidade boa para as crianças.

Atento a este direito, o Instituto Pereira Passos da Prefeitura do Rio disponibiliza para acesso público a informação sobre o uso do solo feita com base em imagens de satélite, cadastro multi-tarifário e pesquisa de campo. A classificação de como o solo da cidade é ocupado e utilizado tem, felizmente, para nós neste trabalho, uma classe de “Áreas de Lazer” já definida e assim descrita:

Áreas de lazer – áreas destinadas ao lazer, contemplativo, esportivo e cultural, como praças, parques, vilas olímpicas, clubes, complexos esportivos, temáticos, estádios, museus, bibliotecas, planetário, observatórios, centros culturais, etc, ressaltando que as áreas verdes expressivas dentro de grandes parques públicos estão representadas nos seus respectivos temas relativos à vegetação (Uso do Solo 2019 -Insitituto Pereira Passos).

Apesar de não formular a diferença na classificação entre lazer privado (pago) e público, ele mostra como estas ofertas se distribuem no território municipal através de um mapa digital. Usando técnicas de geoprocessamento, calculamos quantos metros quadrados de áreas de lazer são ofertadas por Região Administrativa da Cidade (menor conjunto administrativo de bairros). Tal dimensão administrativa nos ajuda a entender também quanto o cidadão carioca consegue ter acesso ao lazer sem a necessidade de uso de transportes. O resultado foi:

A pureza da resposta das crianças? 

2. Áreas verdes: Neste mês, tivemos a comemoração da Semana do Meio Ambiente, aquele período em que os políticos batem fotos plantando uma árvore em uma calçada qualquer de seu feudo eleitoral ou postando frases motivacionais ambientais na rede social, salvo raras exceções, mas o que realmente sabemos sobre a importância das áreas verdes em uma cidade? 

Não adianta ter uma enorme floresta em alguns “cantos” (geográficos) do município e o resto da cidade sem áreas verdes. Os efeitos de controle térmico (ilhas de calor) e de poluição (atmosférica) não se estendem muito além das fronteiras desta área verde. Em um exemplo bem claro, a poluição do ar em São Paulo não é depurada em uma floresta do Vietnã, ou em maior escala, a poluição da Avenida Brasil não é contida pela Floresta da Tijuca, pois a distância da Área de Planejamento 3 (a mais populosa e povoada da cidade) da Floresta da Tijuca é muito maior do que a distância até a Refinaria de Petróleo de Duque de Caxias, por exemplo, ou da própria Avenida Brasil que a corta. 

Recorrendo, mais uma vez, aos ricos dados sobre Uso do Solo do Instituto Pereira Passos da Prefeitura do Rio, resgatamos que a análise de Áreas de Lazer não se aplica para áreas verdes, conforme trecho destacado: “ressaltando que as áreas verdes expressivas dentro de grandes parques públicos estão representadas nos seus respectivos temas relativos à vegetação.”

Sobre as classificações dos temas relativos no mapa de Uso de Solo para a vegetação temos:

Grupo áreas não urbanizadas:

Áreas com cobertura vegetal arbórea e arbustiva – floresta (ombrófila); restinga e mangue (formações pioneiras); capoeira em diferentes estágios (vegetação secundária) e reflorestamentos.

Áreas com cobertura vegetal gramíneo-lenhosa (campo) – áreas com vegetação rasteira, graminóides, situadas em planícies ou encostas, utilizadas ou não para atividades pastoris (Uso do Solo 2019 – Insitituto Pereira Passos).

Que assim se distribuem entre as Regiões Administrativas:

A pureza da resposta das crianças? 

3. Síndrome Respiratória Aguda Grave. 

O interessado leitor já deve ter observado que, com pequenas exceções, há uma coincidência na existência de Áreas de Lazer e de Áreas Verdes no Rio de Janeiro. Colocaremos então um terceiro indicador para verificar se há mais coincidências. 

Já há um consenso que há correlação entre áreas verdes próximas às moradias, redução de partículas em suspensão e melhoria de saúde, inclusive respiratória. Abaixo cito um texto sobre:

A purificação do ar: a literatura mundial relaciona a poluição do ar à redução da expectativa de vida e maior risco de infarto, pneumonia, bronquite crônica, asma e câncer do pulmão, entre outras doenças. O ar poluído já é a primeira causa ambiental de mortes no mundo, ultrapassando a água contaminada e doenças infecciosas. Um dos benefícios mais importantes da presença de áreas verdes nas cidades é que as árvores produzem oxigênio por meio do processo de fotossíntese, reduzindo gases de efeitos estufa ou ainda captando parte das partículas finas em suspensão no ar. A cobertura vegetal pode absorver e filtrar grande parte dos materiais particulados e elementos tóxicos, como enxofre e manganês, que ficam retidos nos troncos das árvores. Portanto, quanto mais densa a área verde, maior a proteção à nossa saúde. Pessoas que residem próximas às áreas verdes nas cidades estão mais protegidas das doenças cardiovasculares fatais. À medida que a moradia se distancia da área verde, aumenta-se o risco dos moradores terem infartos do coração (Como as áreas verdes nas cidades geram benefícios para a saúde, Marcia Hirota e Evangeina Vormittag* epoca.oglobo.globo.com – 03/11/2015).

Em outra análise, chegou-se à conclusão que a contínua exposição de partículas em suspensão no ar impacta diretamente indicadores de Síndrome Respiratória Aguda Grave:

No processo de seleção das variáveis, notou-se que o efeito de pm2.5 passou a ser negativo a partir da inclusão da variável dias acima de 25, o que pode indicar que o fator de maior importância está na continuidade da exposição à poluição em um patamar elevado, mais do que a concentração por si só. De fato, o aumento de um dia no mês com concentração média de material particulado leva a um aumento na expectativa do número de internações em cerca de 2.0% para Covid e em 2.6% para SRAG.

Os números de SRAG (Sindrome Respiratória Aguda Grave) no Rio de Janeiro desde 2013 até o mês de abril de 2022 assim se comporta por Região Administrativa:

Dados de Notificações de SRAG por crianças de um a quatro anos por Região Administrativa do Rio de Janeiro, e a respectiva taxa.

Esta afinal é a resposta das crianças, pois tais as informações tratam da saúde respiratória de crianças de um a quatro anos de idade apenas.

Tendemos a nos excluir deste cenário em que nos vemos dependentes do Meio Ambiente no qual vivemos. E, na cidade, há diferentes níveis de dependência, desde a mais forte, vista em cartões postais e que resultam em turismo, até o que nitidamente só se traduz em indicadores de saúde pública.

Que sejamos capazes de olhar mais do que a visão que nos é fornecida por massificação de mídia e possamos nos ater aos fatos e aos dados.

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