PACOTE OLÍMPICO 2 – O CAMPO DE GOLFE E APA MARAPENDI

Prejuízo Irreversível à Área de Proteção Ambiental do Parque Municipal Ecológico de Marapendi

PARA ENTENDER
Para entender a questão do Campo de Golf destacada pela imprensa nos últimos dias é preciso conhecer o projeto da Via 2, atual Avenida Prefeito Dulcídio Cardoso que, sob a ótica do desenho urbano da Barra da Tijuca, é emblemática.

Esta avenida foi modificada há alguns anos para permitir a criação de um campo de golfe menor. A Reserva foi preservada. Agora pretende-se aumentar a área do campo levando-o até às margens da Lagoa de Marapendi, com o sacrifício de parte da Reserva que é protegida pelas leis do Meio Ambiente há mais de meio século. É apenas um item do enorme PACOTE OLÍMPICO 2.
A VIA 2 – UM PROJETO, UMA SALVAGUARDA

Plano Piloto para a Baixada de Jacarepaguá – Lúcio Costa
Internet
Avenida Prefeito Dulcídio Cardoso – a Via 2 – é uma das avenidas estruturais projetadas para a Baixada de Jacarepaguá: começa na beira do Canal de Marapendi, que liga as lagoas da Tijuca e Marapendi; segue a margem norte do canal e prossegue contornando a Lagoa até a Av. Djalma Ribeiro e faz curva à direita até Av. Alfredo B. da Silveira, antiga Via 9.



No desenho proposto com base no Plano Piloto de Lúcio Costa, além de integrar as avenidas principais do sistema viário previsto para a imensa região, a Via 2 teve uma função singular: foi projetada guardando-se uma distância da margem norte da Lagoa de Marapendi para separar o território classificado em 1976 como subzona A-19: área gigantesca e ‘verde’ que contorna a lagoa. Lá haveria construções esparsas e pequenas, restritas a restaurantes, bares, casas de chá e clubes, em terrenos amplos.

O traçado da avenida foi modificado há alguns anos para permitir a criação de um campo de golfe particular com vistas aos Jogos Olímpicos 2016.

Agora, novas modificações nas leis urbanísticas do Rio de Janeiro são anunciadas, outra vez sob alegada ‘necessidade’ frente aos grandes eventos que a cidade receberá, desculpa recorrente para as mais questionáveis decisões urbano-cariocas dos últimos anos, já tratadas aqui, por exemplo, em RIO + 20 Leis Urbanísticas.

Entre as alterações está a eliminação de uma área de reserva ambiental vizinha ao traçado da antiga Via 2.



A APA MARAPENDI 

Barra da Tijuca, Baixada de JacarepaguáLagoa de Marapendi, APA e Parque Marapendi
Custódio Coimbra – Internet

As primeiras propostas de proteção ambiental para a região são da década de 1930. A RESERVA BIOLÓGICA DE JACAREPAGUÁ, instituída em 1959, foi tombada pelo governo do antigo Estado da Guanabara em 1965. 

Leis posteriores mantiveram a tônica da preservação, inclusive a Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, até à criação da ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DO PARQUE ZOOBOTÂNICO DE MARAPENDI – APA MARAPENDI, em 1991, ratificada pelo Plano Diretor de 1992. Assim, existe uma área maior que é a APA do PARQUE e dentro do seu perímetro, o PARQUE ECOLÓGICO propriamente dito. Ou seja, a APA abrange o PARQUE e o envolve para protegê-lo mediante normas específicas.



Lagoa de Marapendi, APA e
Parque Marapendi – 1991

Internet

A APA foi regulamentada em 1993. Em 1995 o PARQUE/APA foi ampliado com áreas doadas ao município e transformado em PARQUE MUNICIPAL ECOLÓGICO DE MARAPENDI
Embora tenha havido a alteração de alguns índices urbanísticos na Avenida das Américas, a proteção em volta das áreas verdes extrapolou os limites da subzona A-19, antes citada, e foi ratificada.





Em 2003 o nome do parque mudou outra vez para PARQUE NATURAL MUNICIPAL DE MARAPENDIEm 2005 a Câmara de Vereadores criou parâmetros urbanísticos novos para o terreno onde será construído o Resort Hyatt, recém-anunciado. Na época, a inconstitucionalidade dessa lei foi arguida. Estava sub-judice. Pelo visto, não está mais.

AVENIDA PREF. DULCÍDIO CARDOSO – VIA 2 – A CONSTRUÇÃO

Como foi explicado em VENDO O RIO, NO ESTADO – ESTUDO DE CASO: BOTAFOGO, escolas, outros equipamentos públicos, praças e terrenos são ‘doados’ ao município obrigatoriamente quando da construção de conjuntos de casas e edifícios ou da abertura de loteamentos. O mesmo ocorre com as ruas novas abertas em função dessas atividades da construção civil. À medida que os empreendimentos são construídos, as ruas respectivas que lhes dão acesso, também o são. É diferente apenas quando o poder público decide criar uma via – como as atuais TransTudo, para ficarmos na região, ou no caso da Avenida das Américas, Linhas Vermelha e Amarela.

Ao contrário, a Av. Prefeito Dulcídio Cardoso vem sendo implantada há mais de 30 anos, por partes – consequência da ocupação gradual por construções nesse trecho da Barra da Tijuca – e assim continua, literalmente, aos pedaços.


A AVENIDA PARTIDA E O CAMPO DE GOLFE

Mapa faz parte do edital de lançamento de concurso de arquitetura para projeto do Campo de Golfe – a área indicada segue até às margens da Lagoa
Instituto de Arquitetos do Brasil
Um dos ‘pedaços’ que ainda faltam para completar a avenida é o que corresponde ao terreno do futuro campo de golfe. Este trecho não mais existe, nem no papel: foi cancelado. Justamente um gestor dito ‘verde’ eliminou a parte da via que seria construída, obrigatoriamente, junto com o empreendimento imobiliário correspondente na Av. das Américas. O motivo foi possibilitar a implantação de um campo de golfe com dimensões menores do que o que hoje é pleiteado.

Um primeiro conjunto de prédios, anunciado “com vista livre para um campo de golfe, a área de reserva, lagoa e o mar”, foi construído. A avenida,      desapareceu, ao que tudo indica para sempre, embora, pelo menos, o trecho de reserva da APA tenha sido preservado e assim esteja até hoje

Mas, como se vê, a dádiva não satisfez.


PACOTE OLÍMPICO 2 – NOVO CAMPO DE GOLFE NA APA, FIM DA  RESERVA

Edital de lançamento de concurso de arquitetura para projeto do Campo de GolfeIndicação do local – Note-se a vegetação existente ao longo das margens da Lagoa
Instituto de Arquitetos do Brasil
“Outro equipamento de grande importância para a realização destes eventos será o Campo de Golfe Olímpico, que acolherá esta atividade esportiva recém incluída nos Jogos, e que se caracteriza por ser uma ampla área verde com baixíssimas taxas construtivas. Neste contexto, para possibilitar sua instalação, faz-se necessário através deste Projeto de Lei Complementar incluir esta atividade dentre aquelas permitidas na Área de Proteção Ambiental de Marapendi, adequando o Zoneamento Ambiental à realidade da área, bastante alterada por atividades antrópicas anteriores, assim como deve-se alterar os limites do Parque Natural Municipal de Marapendi”.
Prefeito Eduardo Paes, 05/11/2012
(No encaminhamento do novo PLC)


Embora a avenida que contornaria a lagoa, preservando a vegetação marginal, tenha sido eliminada para a construção, privacidade e isolamento do futuro campo de golfe, a Zona de Conservação da Vida Silvestre – ZCVS criada em 1993 na área da APA foi mantida, como citado.

Para aumentar o tamanho do Campo de Golfe e levar a área particular até à margem da Lagoa de Marapendi a atual gestão propõe eliminar a ZCVS, que pertence a uma região protegida pelo menos desde 1959. A benesse vai além do imaginável: a área de 58 mil m² a ser agora acrescentada ao campo e transformada em uma pradaria particular foi DOADA ao antigo Estado da Guanabara em 1973! Há que investigar se é área pública.

Campo de Golfe – Anexo ao PLC 113/2012, conforme artigo 4º
“Art. 4º Fica excluída dos limites do Parque Natural Municipal de Marapendi a área
de recuo doada ao Município do Rio de Janeiro no PAL n.º 31.421, conforme
descrição e mapa ilustrativo constantes no Anexo III desta Lei Complementar”. 

Anexo III – Área de 58.485,00 (cinquenta e oito mil, quatrocentos e oitenta e cinco) metros quadrados, medindo 240,00 (duzentos e quarenta) metros pelo alinhamento projetado pelo PAA 9161 – DER; 380,00 (trezentos e oitenta) metros em linha sinuosa pela Lagoa de Marapendi; 335,00 (trezentos e trinta e cinco) metros à direita e 173,00 (cento e setenta e três) metros à esquerda, conforme termo de recuo com doação gratuita de área celebrado entre o Estado da Guanabara e Holophernes Castro e sua mulher, em 10 de dezembro de 1973 (publicado no D.O. de 18 de dezembro de 1973). 


Campo de Golfe – Anexo ao PLC 113/2012
Na versão 2012 abrange a área de reserva ambiental.



A INCÓGNITA: BENEFICIAR O QUE OU QUEM. A CERTEZA: NÃO SERÁ O MEIO AMBIENTE


A mudança para eliminar a área da APA proposta pelos Projetos de Lei Complementar 113 e 114/2012 sob a alegação de se criar e beneficiar um parque, não convence. A área existente entre a praia e a margem sul da Lagoa de Marapendi também pertence à APA e ali já existe um parque. Em ato igualmente questionável, foi criado pelo atual Prefeito em 2011 e batizado de PARQUE NATURAL MUNICIPAL DA BARRA DA TIJUCA. Está no mapa ao lado.


HÁ MUITO MAIS

APA Marapendi
Rico Surf / P-Reserva
O assunto é complexo e será tratado em vários posts. Por enquanto analisou-se aqui somente o Campo e a área protegida pela legislação de Meio Ambiente, que será eliminada.


A afirmação de que a ‘troca’ da benesse pelo aumento do campo de golfe será benéfica e permitirá a manutenção do Parque – que está em local protegido, vale lembrar – parece ser um sofisma. Envolve transferência de potencial construtivo. Há que ser destrinchada.

Quanto ao terreno do Resort Hyatt, é outro assunto. E ainda tem os gabaritos do Parque Olímpico!
Haja cimento!

APA Marapendi – terreno Campo de Golfe
Internet
APA Marapendi – terreno hotel Hyatt
Internet


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