Buraco do Lume: a pequenez destrói o Rio

A volta do que não foi.  Brasil e Rio de Janeiro estão presos em um túnel de tempo.

A notícia no Jornal O Globo publicada na noite desta quarta-feira,  revela, mais uma vez, o descaso pela cidade que já foi chamada de Maravilhosa.  Após reconhecer o Buraco do Lume, no Centro, em 2020, como patrimônio do estado, a Assembleia Legislativa do Rio agora simplesmente dá vários passos para trás e aprovou um projeto de lei que destomba o espaço.  A proposta, que segue para sanção ou veto do governador, mira um terreno particular dentro da Praça Mário Lago (nome oficial do Buraco do Lume).

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Buraco do Lume, no Centro, é destombado pela Alerj e pode virar espigão

Projeto do deputado Rodrigo Amorim (PTB) destomba o espaço reconhecido como patrimônio do estado em março de 2020

Por Ludmilla de Lima – O Globo

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Área do buraco do lume no centro do Rio – Foto: Domingos Peixoto

Depois de reconhecer o Buraco do Lume, no Centro, em março de 2020, como patrimônio do estado, a Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) voltou atrás na medida, aprovando nesta quarta um projeto de lei do deputado Rodrigo Amorim (PTB) que destomba o espaço. A proposta, que segue para sanção ou veto do governador, mira um terreno particular dentro da Praça Mário Lago (nome oficial do Buraco do Lume). Mesmo sem detalhar a sua área, especificando o seu tamanho – ela é descrita como um terreno na Avenida Nilo Peçanha, “designado Lote l da Quadra A” -, o projeto acabou passando, sob clima tenso.

Rodrigo Amorim chegou a se referir ao Buraco do Lume, palco de manifestações políticas e área verde hoje vizinha à nova Alerj, como “antro de balbúrdia e consumo de drogas”. No projeto, a justificativa é de que o objetivo do destombamento do espaço (que no texto não é chamado de Buraco do Lume) seria “colaborar para a melhor utilização de espaços urbanos no Centro do Rio de Janeiro, viabilizando o aproveitamento e ocupação de terreno não-edificado, de modo a promover o desenvolvimento urbanístico e econômico da região próxima a esta Casa Legislativa, em atendimento às normativas de planejamento urbano”. O texto concluiu que a medida pode ajudar “gerando novos incentivos econômicos para a região e mitigando o esvaziamento da localidade”.

Deputados de partidos de esquerda, no entanto, acusam de haver interesses especulativos por trás da proposta. Alguns parlamentares chegaram a questionar a validade do projeto pela falta de um memorial descritivo. No município, há um decreto de 1986 em vigor que preserva o Buraco do Lume.

— Trata-se de um terreno uno que é uma praça, e faz menor sentido que esse terreno uno que tem o Buraco do Lume seja desmembrado em dois, havendo o destombamento de uma praça para ter uma incorporação qualquer em frente à Assembleia Legislativa do Rio. Esse é pulmão importante para todos nós e que gera emprega e renda para os que vivem do comércio nessa área – disse o deputado Luiz Paulo (PSD), responsável por voto divergente dentro da Comissão de Constituição e Justiça.

Já Amorim afirmou:

— É um lugar de lixarada. Não serve para nada esse Buraco do Lume.

Durante a sessão, o presidente da Casa, André Ceciliano (PT) colocou em dúvida a viabilidade de um investimento no lugar, devido à quantidade de prédios vazios no Centro. O deputado Eliomar Coelho (PSOL), autor do projeto do tombamento ao lado de Ceciliano, se revoltou, prometendo ir à Justiça:

— Não se aprovou um projeto, mas um crime. Esse projeto aqui não diz nada. Aqui tem um projeto com todas as delimitações da Praça Mário Lago e, simplesmente, fizeram um quadrado em cima dela. Não tem tamanho, medida. Ele não significa nada – declarou ele. – Não é assim que a banda toca. Eu vou à Justiça.

A deputada Renata Souza (PSOL) lembrou que no local há uma estátua da vereadora assassinada Marielle Franco e que o deputado Rodrigo Amorim protagonizou uma cena quebrando uma placa com o nome dela. Para a deputada, a medida é um “escárnio”. O PSOL chegou a apresentar uma emenda criando um memorial às vítimas da Covid na praça, mas ela não foi aprovada.

Com o tombamento em 2020, só estavam permitidas no Buraco do Lume a construção “e implantação de equipamentos destinados a atividades culturais, vedada qualquer outra destinação”. Eliomar Coelho, na época da aprovação do projeto na Alerj, afirmou que o objetivo era proteger o espaço, barrando qualquer tentativa de construção de prédios no local.

A origem do nome Buraco do Lume

Reduto tradicional da esquerda, o Buraco do Lume não tem esse apelido à toa. Na década de 1950, a empresa Lume Empresarial (o nome se refere às iniciais do empresário Linaldo Uchoa Medeiros) comprou imóveis no lado ímpar da Rua São José para erguer ali um espigão de mais de 20 andares que daria frente também para a Avenida Nilo Peçanha. Só que a empresa faliu, deixando na área, que já foi parte do Morro do Castelo, um grande buraco. O terreno escavado era para abrigar as fundações e garagem do prédio, mas a obra parou por aí. E os cariocas não perdoaram, batizando informalmente esse pedaço do Centro do Rio de Buraco do Lume.

Em 1970, o antigo Banco Estado da Guanabara comprou o terreno e vendeu algumas unidades do futuro edifício. Mas o projeto, mais uma vez, não foi para frente. Ainda nos anos de 1970, o lugar foi urbanizado e transformado em praça. O buraco foi transformado num lago com passarelas. A configuração atual é dos anos de 1990, quando perdeu o lago e os jardins.

Hoje o local funciona como anfiteatro, sendo palco semanal de políticos de esquerda — do PT e do PSOL, sobretudo —, que costumam ali prestar conta de seus mandatos. Nos anos de 1980, o ex-deputado Vladimir Palmeira discursava para a multidão na praça sobre um caixote. A praça já se chamou Melvin Jones, mas o nome foi trocado para Mário Lago no fim dos anos de 1990 com projeto do então vereador Eliomar Coelho.

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